4/26/2005

Globalização frutífera

Vai um homem ao IKEA para comprar umas coisas, encontra umas tantas e outras nem por isso. Passada a caixa, desemboca no mini-mercado de produtos suecos e traz mais umas coisitas, entre elas um doce de laranja. O nome que o rótulo trazia --Apelsin -- soou-me a algo familiar. "Laranja" em alemão é "Apfelsine", palavra muito parecida com o vocábulo sueco. Admito que nunca tinha pensado na origem da palavra. Como "Apfel" é maçã e a grande maioria dos frutos antigamente eram "maçãs + qualquer coisa", pensei que o nome talvez significasse "maçã da China". Uma busca rápida no dicionário confirmou-me a hipótese. E vem do holandês. Ora, os holandeses foram, juntamente com os portugueses e, mais tarde, os ingleses, os grandes navegadores dos mares do Oriente, e não só.
Palavra puxa palavra, fui-me lembrando de umas coisas que, em jeito de conversa informal, passo a partilhar. Talvez achem curioso. Se não, é só passar à frente. Para começar, confirmo que, antigamente, a maior parte dos frutos eram designados por "maçãs", a que se juntava um designativo. A palavra latina genérica para frutos era "pomum", que deu o "pomme" francês. Por esse motivo, as batatas em França são "pommes de terre". O nome das nossas batatas provém das Caraíbas. De relativamente perto de lá, do México, veio também o tomate, que a princípio recebeu dos ingleses e americanos a denominação de "apples of love". O que eles foram buscar! O "persicum pomum", i.e. a maçã da Pérsia, é hoje o pêssego. O alperce também tem "Pérsia" no seu nome, como facilmente se percebe. Já a tangerina evoca Tânger. O "pineapple" inglês, que foi originariamente a pinha, é hoje o ananás. Entende-se pela forma. "Laranja" vem do árabe "naranj". Curiosamente, em espanhol mantém o "n", mas em português essa soante passou para outra soante: o "l". É o tal "l" que, juntamente com uma terceira soante, o "r", faz os chineses nos seus lestaulantes falalem em "lalanja com açúcal". Noutras línguas comuns, nem "n", nem "l". Só "orange". Como foram barcos portugueses que primeiro trouxeram a laranja doce -- e a respectiva laranjeira -- dos mares da China para o Golfo Pérsico, "laranja" significa "Portugal" nos países do Golfo e também pelo menos na Grécia e na Turquia. "Portugalia tchai" não é na Turquia outra coisa senão "chá de laranja". A banana é que não entra neste grupo, embora faça parte da globalização frutífera que dá o título a este arrazoado. "Banana" vem do vocábulo árabe que significa "dedo". Damasco, capital da Síria, legou-nos os damascos. A romã é "pomegranate" em inglês, o que nos vai levar de volta às maçãs.
E terminemos aqui esta salada de frutas, que é afinal um pequeno espelho do mundo das viagens comerciais que iniciaram a globalização de que hoje tanto falamos. (Quanto ao IKEA, tem a nacionalidade do famoso "bacalhau sueco". E a "sueca" -- jogo de cartas -- também poderia ser para aqui chamada.)

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