Parece-me extremamente lúcido e bem informado um artigo publicado no número de 31 de Janeiro da revista americana Newsweek. O que o texto de Andrew Moravcsik basicamente pergunta é se existe razão para a persistência do "American Dream" e se o modelo americano continua a ter seguidores. Segundo uma recente sondagem de opinião da BBC, existe uma diferença abissal entre o que os americanos pensam de si próprios e a forma como os estrangeiros os vêem. Setenta e um por cento dos americanos encaram os Estados Unidos como fonte de bem para o mundo e cerca de 80 por cento (!) perfilham a opinião de que as ideias e os costumes americanos deveriam ser seguidos no mundo inteiro.
É bem diferente a opinião dos estrangeiros. Cerca de 60 por cento dos inquiridos vêem na reeleição de Bush uma ameaça para a paz mundial. É, afinal, entre os tradicionais aliados da América que os números são mais elevados: 77 por cento na Alemanha, 64 por cento no Reino Unido e 82 por cento na Turquia. O apoio público dado pelos 1,3 biliões de membros do mundo islâmico é praticamente nulo. Respostas positivas vêm apenas da Polónia, das Filipinas e da Índia. Como era previsível e este mesmo blog cedo predisse, de uma atitude anti-Bush o mundo está a passar para uma atitude anti-americana.
O problema é que a América não se apercebe que o mundo já não a está seguir. O anti-americanismo é principalmente patente na Europa e na América Latina. Os países têm seguido várias vias, sendo que nenhuma delas é baseada no modelo americano. Sob o ponto de vista da democracia, os europeus acorrem muito mais ao voto (as percentagens oscilam entre 60 e tal por cento e 80 por cento) do que os americanos (47 por cento). No que respeita à qualidade das instituições públicas, analisada segundo critérios objectivos e independentes, a Dinamarca, a Islândia, a Finlândia, a Nova Zelândia e a Noruega ocupam os cinco primeiros lugares. Os Estados Unidos são relegados para o 21º. No que toca à pobreza infantil, os cinco países que se encontram à frente, com menor quantidade e portanto melhores condições, são a Suécia, a Noruega e a Finlândia. Os EUA ocupam o 22º posto e a sua taxa de mortalidade infantil situa-se entre as mais elevadas dentro do grupo dos países desenvolvidos. Aliás, a Organização Mundial de Saúde coloca os Estados Unidos na 37ª posição! Analisando o equilíbrio dos rendimentos das famílias, a Dinamarca cota-se como o país mais equilibrado, seguida do Japão e da República Checa. Os EUA ocupam o 71º posto (Há vinte anos, o Presidente de uma grande companhia americana, ganhava 39 vezes o salário do trabalhador médio; presentemente, essa proporção aumentou para 1000 vezes!).
No campo dos tratados e instituições mundiais em que se esperaria encontrar a presença dos EUA, eles estão fora de pelo menos 10 (dez): acordos sobre a discriminação feminina, sobre os direitos da criança, sobre direitos económicos sociais e culturais, Protocolo de Quioto, tratados de proibição de testes nucleares, de mísseis anti-balísticos, de armas biológicas e tóxicas, de armas químicas, de minas terrestres, e Tribunal Penal Internacional. Todas estas auto-exclusões dos Estados Unidos mostram que o país não quer acertar o passo com o resto do mundo. Quando a União Soviética se desintegrou, houve constitucionalistas americanos que se apressaram a visitar o país para sugerir uma nova constituição, baseada no modelo dos Estados Unidos. Foram recambiados. Igualmente na República Checa, Vaclav Havel é claro ao afirmar que, do ponto de vista europeu, o dinheiro fala demasiado alto na democracia americana, há demasiada influência dos lobbies, e demasiada influência da televisão para determinar a fotogenia dos futuros governantes.
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