11/30/2005

A todos aqueles que ingloriamente se esforçam por aprender inglês

"Não há língua mais fácil no mundo", dizem os que a falam desde o berço. Como ninguém é bom julgador em causa própria, veja você por si, como português de gema.
No outro dia, um amigo meu, que arranha inglês e foi a Londres em visita turística, ficou num hotel que estava em obras de restauro. Em pinturas, para ser mais exacto. A dado momento, ouviu alguém gritar Look out!, num andar muito por cima do seu. Correu à janela ao chamamento, só para levar na cabeça e nos ombros com a tinta de uma grande lata de plástico que escorregara das mãos do pintor. Concluiu, assisadamente, que quando os ingleses gritam look out! querem dizer que não se deve olhar para fora. Ainda por cima, o verde escuro nunca foi a sua cor favorita.
Esse mesmo amigo contou-me que, nessa noite, uma moça londrina o embaraçou quando, suave e languidamente, lhe perguntou, no bar onde tomavam um drink: "Which is the best flower to kiss?" Ele corou, murmurou um atrapalhado "I don't know" e ficou depois a ouvir a moça sussurrar-lhe, candidamente: "Tulips" (two lips).
Em inglês você julga que uma coisa é A, e depois ela sai B. Se você se lastimar do dinheiro que um pickpocket lhe surripiou do bolso, é capaz de ouvir o seu interlocutor dizer-lhe "I sympathize". Está você já todo contente com o facto de o considerarem simpático, quando uma mirada ao seu pequeno dicionário o informa que sympathize significa algo como "sinto muito!" Desmancha-prazeres!
É difícil entender uma língua com tantas rasteiras. Todos nós aprendemos a dizer "smoking" e chegamos a uma terra inglesa e constatamos que smoking não é coisa que se vista. Aliás, os dizeres que se encontram aqui e ali não são a dizer que é preciso usar smoking, mas a indicar precisamente o contrário: No smoking!
Anda um homem à espera de um fim feliz para a sua estadia, um happy end como ele sempre disse, e depois descobre que, afinal, é happy ending. Porque é que não disseram antes? Também o jogo do box não é assim que se diz, mas sim boxing, e o nosso surf, tão British, afinal é surfing. Que história é esta?!
Mas há muito mais, tanto que parece mesmo ser para nos fazer pirraça. Fala um homem em Christianism e emendam-nos, polidamente, para Christianity. Se falamos em Romantism, corrigem-nos para Romanticism. Se dizemos "lubrificate" quando pedimos para nos lubrificarem o carro, atiram-nos com um lubricate que é parecido mas faz o nosso verbo estar errado. E se quisermos condecorar alguém com umas medalhitas lusas e falamos em condecorate, atalham-nos o discurso. É decorate. Também o que deveria ser confraternize é apenas fraternize. Já podiam ter avisado antes!
Em matéria de grafia e pronúncia então, estamos conversados. Um verbo como to read, read, read devia obviamente ler-se da mesma forma. Devia! Estou convencido de que eles põem letras só para nos atrapalharem: em should, o -l- não se lê. O.K. Chegava. Era uma excepção e a gente aceitava. Mas não: em would, could, calm, salmon e mais uma chusma de palavras fazem o mesmo! A isto chamam eles simplicidade!
A história não fica por aqui: castle não tem um -t- audível, tal como listen. Debt e doubt têm o -b- só para nos confundir, e quanto ao -ough que aparece em tantas palavras, só está lá para ver se nós conseguimos resolver o problema: em tough, cough, trough, through, borough e thorough é um verdadeiro jogo de atirar a moeda ao ar a ver se se acerta. Não se acerta!
Imagine que hiccough, palavra que aparece em histórias de banda desenhada sob a forma abreviada de "hic" (soluço, principalmente quando se apanhou uma bebedeira), se pronuncia hik-kup (a última parte como cup).
Foi por estas e por outras que o filho de um outro amigo meu, já farto de andar a apanhar bonés com a língua inglesa em Londres, ficou doido quando leu um título no jornal de uma senhora que seguia no banco da frente do seu autocarro. Embora a notícia fosse sobre uma exposição que tinha alcançado grande êxito, o título, que foi tudo o que ele leu, dizia: "Exhibition pronounced success". No dia seguinte apareceu de volta na casa dos pais em Lisboa. Para experiência já bastava!

11/28/2005

Presidenciais

Por razões que não consigo descortinar, ninguém ainda aflorou aqui a questão das presidenciais. Talvez seja por fartura de política, talvez seja por cansaço relativamente aos candidatos -- um déjà vu a provocar um enorme bocejo. Seja como for, há um aspecto interessante: temos pela frente um autêntico direita-esquerda. Há um candidato único da direita, contra cinco da esquerda (um deles, filho do homem que primeiro me ensinou inglês a sério, farta-se de protestar que não lhe ligam, e até parece ter razão no seu sentir-se discriminado).
Um encontro tão directo da direita contra a esquerda nas presidenciais era algo que não se via há bastante tempo. Parece-me interessante, como intróito, rever um pouco a matéria dada sobre este assunto. Começarei por lembrar que sempre que alguém nos diz que "essa de esquerdas e direitas é pura balela", esse alguém é, sem margem para dúvidas, de direita. Porquê? Porque ser de esquerda exige uma tomada de consciência e um sentimento de revolta mais ou menos acentuado que não se compadece com a não-existência de, pelo menos, um dualismo. Pelo contrário, a quem é de direita convém esbater as diferenças para que o status quo se prolongue sem alterações de maior. Com evolução sim, nunca com revolução.
Não quer dizer que todos os esquerdistas sejam revolucionários, mas há decerto algo com que se preocupam bem mais que as pessoas de direita: com a justiça social. O valor número um da esquerda sempre foi uma tendência para a igualdade. Isto não significa todos muito ricos, mas sim todos com bons meios de subsistência. Para quem é de esquerda, repugna que a desigualdade excessiva provoque o domínio claro de uns pelos outros, o que vai contra uma desejada harmonia social.
Para a direita, o valor número um é a ordem. Cada peça no seu lugar no tabuleiro de xadrez. Congruentemente, a direita defende a tradição, que torna as diferenças sociais legítimas porque atestadas pela história. O que a direita defende não é a liberdade que a esquerda entende: liberdade de pensamento e expressão num contexto de rule of law.Defende, sim, um conceito de liberdade desregulada. Assim, quem mais tem, mais poderá acumular. Mas essa desregulação, que tem largos efeitos práticos, tem algo a precedê-la em matéria de relevância: a segurança. A manutenção da ordem. Não há nada que a direita mais tema do que a desordem.
Esquerda e direita são populistas na sua ânsia de angariarem votos. Mas a cultura da direita, ao apelar aos que tão diferentes são em matéria de rendimentos, pretende mais do que tudo manter a situação, com a dominação dos muitos pelos relativamente poucos.
Quem não soubesse, entenderia imediatamente pelo que escrevo que sou de esquerda. Acredito na possibilidade de um mundo melhor, que não é necessariamente um mundo mais rico, mas encerra certamente uma melhor distribuição da riqueza. Acredito mais no valor da liberdade do que da segurança, que tantas vezes é usada para cercear as liberdades. Aceito aquela máxima muito simples que nos diz que a direita sabe fazer dinheiro, mas não sabe distribuí-lo, enquanto a esquerda sabe distribuí-lo, mas não o sabe fazer. Considero-a, no entanto, uma asserção tipicamente de direita, na medida em que se refere exclusivamente a dinheiro, o que, sendo importante, é manifestamente insuficiente.
Tenho para mim que existem basicamente dois grandes pólos ideológicos, dos quais um é mais característico da esquerda, e o outro do pensamento mais conservador da direita. Em resumo possível, direi que: a direita pretende basicamente o crescimento da riqueza, enquanto a esquerda luta pela sua redistribuição. À liberdade empresarial da direita contrapõe-se um ideal de igualdade de oportunidades da esquerda. Ao conceito de segurança da direita o ideal da liberdade. À forma mais tradicional de família da direita responde a esquerda com novas formas de vida em conjunto. À exploração de matérias-primas que a direita defende nas suas políticas de curto prazo, replica a esquerda com a luta pela defesa e conservação do ambiente.
São opções claras, com pontos de vista nitidamente diferenciados, embora às vezes o contexto internacional obrigue a práticas quase semelhantes em determinados aspectos.
Relevantes são, ainda, as diferentes maneiras de encarar o Estado. Tanto a esquerda como a direita consideram-no essencial nas suas políticas. A um Estado mais redistribuidor e interventivo da esquerda, responde a direita com um Estado mais liberal, garante da ordem e da segurança, benévolo na fiscalidade
Neste pano de fundo, Cavaco Silva tem o apoio da direita. Todos os grandes grupos económicos estão com ele. Os restantes candidatos, que se degladiam uns aos outros, pugnam no campo da esquerda.
Até agora, Portugal tem tido presidentes bastante consensuais e que não originaram descontentamentos de vulto. A direita apoiou Mário Soares na sua reeleição, se bem me lembro. A única situação mais grave ultimamente foi o derrube do governo de Santana Lopes, algo que no entanto foi tão aprovado pela maioria da população que acabou por resultar na maioria absoluta conferida aos socialistas.
Agora, esboça-se uma radicalização maior. A ver vamos.

11/25/2005

Ministério da Educação e docentes (II)

Foi há cerca de vinte anos que, intrigado com a falta de conhecimentos de muitos dos estudantes que recebia das escolas secundárias, pedi a três alunas minhas para me contarem o que se passava. Eram três alunas especiais, docentes de francês e português no ensino básico e secundário. Amigas, as três tinham decidido aproveitar a oportunidade que a escola superior em que eu estava lhes oferecia para se matricularem em cursos livres de línguas. Como a expressão se fazia na língua que estavam a reaprender, a sua prática oral serviu até de razoável exercício, sem as inibições que às vezes estudantes sentem ao exprimir-se em línguas estrangeiras. É que o assunto não só lhes dizia respeito como, além disso, elas tinham imensa vontade de se abrir sobre o tema.
Devo dizer que sempre considerei os "desabafos" pessoais algo de importante. Deitar cá para fora coisas que nos oprimem (e abafam, no sentido de nos tirarem o fôlego ou criarem aperto -- a angústia, a ansiedade, o Angst alemão que está ligado a isto tudo, tal como a angina pectoris) é uma verdadeira e saudável catarse. Abafo é pressão, pelo que conseguir extravasar essa pressão é fundamental. É, no fundo, a ex-pressão.
E as "alunas" expressaram-se. Ainda hoje me recordo bem das suas ideias. Eram de profundo desapontamento. Porquê? Basicamente por questões de disciplina geral e de rigor. Não se pense que me falaram nessa coisa mediática que dá pelo nome de violência física, com agressões e coisas do género. Falaram-me de outro tipo de violência. De se sentirem impotentes perante a sociedade, os seus meninos e meninas, e ainda os respectivos pais. Estes alijavam a carga sobre os docentes das escolas, exigindo aos professores aquilo em que frequentemente eles próprios eram permissivos. Queriam que os docentes endireitassem a vara torta que lhes entregavam, em termos de respeito, disciplina e prazer de trabalhar. Queriam também resultados bons: era essencial que os filhos passassem de ano. Mas não eram só os pais a quererem isso. O próprio Ministério tinha criado todas as condições para que as estatísticas educativas fossem mais risonhas. E, diziam-me elas, é bastante difícil chumbar alunos. Temos que responder a quesitos vários. Ora, a realidade simples é que muitos dos estudantes não sabem o suficiente para passar. Porém, com a pressão daqui e dali, acabam por transitar para o ano seguinte. Sentimo-nos naturalmente desautorizadas. Essas passagens imerecidas levam à falta de aplicação dos alunos no ano posterior. Para quê estudar tanto, se a passagem está praticamente garantida? E não é a passagem que interessa aos pais?
Infelizmente, tem-se andado há muito neste engano. Recordo-me de, há anos, ter encontrado nos lavabos de uma escola politécnica em que leccionava, um protesto escrito na parede: "Queremos licenciatura univercitária!" E, mesmo com a grafia errada, obtiveram-na. O engano do facilitismo e da escola light foi fatal. Enquanto por palavras se falava em "escola de excelência", a realidade mostrava algo substancialmente diferente. Nunca se deveria ter ido por aí. Isso representou o abanar das estruturas. Não foi algo apenas conjuntural para que as estatísticas revelassem enormes progressos do país, a que corresponderiam mais fundos de apoio europeus. A situação abalou o edifício social, muito para além da escola, e esta foi, por sua vez, afectada pelo abalo do edifício social. Entrou-se na teoria do aluno-coitadinho. Existem notórias excepções, como é óbvio, mas o resultado global está à vista de todos. O interesse pelos fins, desprezando a forma como a eles se chegava, foi fruta podre que contaminou mais do que devia. Este é um assunto longo, que exigiria muito espaço e exemplos concretos, que aliás abundam. Limitemo-nos à questão dos professores.
Com o problema da notória desresponsabilização social em que frequentemente se entrou, os docentes honestos e sérios ficaram verdadeiramente desolados. Esses professores mais não pretendem do que rigor, o reconhecimento do seu trabalho e do esforço dos seus alunos. Querem justiça, como todo o ser humano que se preza. Com o abalo da estrutura social, o status do professor sofreu. Os concursos sucessivos de colocação nas escolas, a mediatização do número de professores a engrossarem a lista dos desempregados, os lamentos frequentes registados nas televisões, não serviram para melhorar esse status. Muito pelo contrário.
Ora, se há algo crucial para que um aluno aprenda é a confiança e a admiração pela pessoa que o ensina. Pela pessoa e pela instituição. Com a exposição frequente nos media, e nas conversas gerais, de diplomados que de facto cometem erros que não são admissíveis, lança-se o descrédito sobre a escola e, em linha directa, sobre os professores. Em geral. Sem separar o trigo do joio. Porque há trigo e há joio.
Em minha opinião, agora mais informada, a situação presentemente imposta às escolas básicas e secundárias contribui mais para aviltar a maneira como os docentes são vistos, e se vêem a si próprios, do que para resolver a questão do insucesso escolar. Entre a qualidade e a quantidade, há que escolher. Existem, de facto muitas coisas a melhorar na escola, mas é preciso nunca perder de vista as raízes da sociedade em que ela se encontra inserida. Com isso, ser-se-á mais justo, mais honesto, e não se procurará arranjar bodes expiatórios únicos.

VERGONHA

Retirado do jornal PÚLICO de hoje:

Hoje é Dia Internacional para a Eliminação da Violência Contra as Mulheres.
Violência doméstica matou 33 mulheres desde o início do ano.
Foram alvejadas a pistola ou caçadeira, golpeadas com faca ou machado, mortas à vassourada, à paulada, ao murro ou pontapé. Desde o início do ano, 29 mulheres foram assassinadas por maridos, namorados ou ex-companheiros, mais quatro por familiares.


Como dizia a canção, "vemos, ouvimos e lemos, não podemos ignorar!"

11/24/2005

PROPOSTA

Agora que está decidido que o novo aeroporto de Lisboa vai ser na Ota, gostaria apenas de propor, em primeira mão, que aos vastos terrenos da Portela, os quais a seu tempo irão ficar devolutos para construção imobiliária, se dê a designação de Bairro dos Políticos. Numa Lisboa que tem, entre muitos outros, o Bairro Azul, o Bairro do Restelo, o Bairro Cardeal Cerejeira, o Bairro da Madre de Deus, o Bairro dos Actores, o Bairro dos Professores, o Bairro das Colónias, o Bairro dos Irmãos Pobres, o Bairro da Liberdade, o Bairro Operário e o Bairro da Penitenciária, está obviamente a faltar o Bairro dos Políticos. Será o maior de Lisboa. Como convém.

(Se sobejar ainda alguma nesga de terreno, que ela seja aproveitada para a edificação do Bairro dos Construtores.)

11/22/2005

Ministério da Educação e Docentes

Em primeiro lugar, gostaria de dizer que, entre os participantes neste blog há pessoas mais qualificadas do que eu para abordar este assunto, na medida em que são professores no activo e sentem estes problemas na pele. Como não avançam, faço-o eu, numa tentativa de colher opiniões que me deixem mais bem informado.
Na passada sexta-feira, os professores de escolas públicas do ensino básico e secundário, em greve, manifestaram-se nas ruas de Lisboa a exteriorizar o seu descontentamento. Cartazes pediam que a ministra fosse "para a rua". Tinham razão? Quem, de um momento para o outro, vê alteradas determinadas expectativas relacionadas com a sua progressão na carreira e condições de reforma, e se vê legalmente proibido de dar explicações aos seus próprios alunos, sente-se inevitavelmente prejudicado relativamente à sua situação anterior. Quem, ainda por cima, se vê confrontado com a obrigatoriedade de passar mais tempo na escola a fim de atender a eventuais necessidades de alunos e a aulas de substituição, considera-se naturalmente privado do tempo livre de que anteriormente usufruía. É humano que os professores reajam nesta altura. Acabou de lhes calhar a fava no bolo.
Do lado do governo, personalizado pela ministra, existe a declarada intenção de (1) não deixar apenas no papel e, portanto, sem cumprimento, leis que já existem, com a finalidade de (2) inverter a situação do insucesso escolar, visto que, dentro da UE, estamos na cauda do aproveitamento dos dinheiros gastos na educação. Muito na cauda, de facto.
Ora, no seu objectivo de incrementar a produtividade, a ministra parece ter razão. No que respeita a alguma da metodologia usada, é possível que tenha menos, muito por culpa, digo eu, de costumes já enraizados nas escolas, da actuação dos conselhos executivos e do ambiente social em que a escola se insere. Por outro lado, pedir colaboração redobrada a quem acaba de ver vários dos seus "direitos adquiridos" cerceados é uma acção que de antemão se previa ser passível de protestos, numa sociedade muito desequilibrada em matéria de justiça social como é a portuguesa.
Com este pano de fundo, ressaltaram os casos mais mediáticos e facilmente ridicularizáveis das aulas de substituição. De facto, não parece admissível que um docente de História fique a substituir a professora de Matemática, que faltou a uma turma que não tem a referida docente de História como professora. Os alunos vêem que a professora não sabe o que há-de fazer com eles. Quanto a ela, sente-se a mais. O que se diz de História e Matemática, diz-se de um docente do 12º ano a substituir um professor do 10º ano, que faltou. Como não há grande respeito em muitas das nossas escolas -- o ambiente social acima referido, que é o do país e até frequentemente retratado ou exagerado em telenovelas --, a situação torna-se caricata tanto para alunos como para professores. Estes vêem o seu status, nesta altura já fragilizado, ainda mais aviltado. Desmotivam-se.
A verdade, porém, é que há muitos professores a faltar. Porquê? Por uma infinidade de razões. Primeiro, porque a maioria dos docentes (mais de 70 por cento) são mulheres. Ora, sabe-se que as mulheres em Portugal são mais sobrecarregadas do que os homens relativamente aos filhos e a outras tarefas. Assim, se um filho precisa de ir ao médico, a mãe, que muitas vezes não pode já pedir à avó da criança para ir com ela ao médico (a avó tem também o seu emprego ou mora longe), vê-se obrigada a faltar ao trabalho. Depois apresenta atestado. A gravidez é outra situação relativamente comum. Noutros casos, é o próprio docente que adoece e tem de ficar em casa. Noutras situações, ainda, pode precisar de ir a um funeral, assinar uma escritura, ir a tribunal, ou fazer algo do género. São razões válidas, mas isso parece originar 10 por cento de faltas (nas escolas públicas, contra apenas 3 por cento nas privadas). Ora, se essas aulas fossem substituídas por um professor do mesmo ano e da mesma turma, que adiantaria a sua matéria ou faria exercícios e revisões, tudo bem. Não haveria inconveniente de maior.
Pessoalmente, foi o que muitas vezes fiz como coordenador de cursos no ensino superior privado. Só que aí, se um professor faltasse a uma aula, não recebia. Se a falta tinha uma doença como motivo, seria depois a Segurança Social a pagar-lhe. No Estado, porém, as coisas são diferentes. Falta-se mais e, com isso, acaba-se por diminuir a produtividade e, principalmente a partir de agora, por sobrecarregar os colegas.
Mas, pergunta-se, não seria possível para os Conselhos Executivos ordenarem as substituições apenas por ano, impedindo portanto que um professor do 9º fosse vigiar uma turma do 5º ano, que não conhece, por quem não é conhecido e que não tem matérias afins com aquela que ele lecciona? Dir-se-á que, com isso, iriam prejudicar mais uns professores do que outros. É possível. Mas prejudicariam menos os alunos. E, numa escola, quem conta mais: os alunos ou os professores? Para os Conselhos Executivos, constituídos por docentes, haverá uma natural tentativa de não prejudicarem os seus colegas. Por serem colegas e por serem também os seus eleitores. Logo, não é impossível que, para se protegerem e não terem contra si a animosidade dos colegas na altura das próximas eleições, os membros do Conselho Executivo não lancem medidas que sejam impopulares. Com isso, porém, acabam por causar outro tipo de descontentamento -- contra o Ministério.
Entretanto, parece que existe uma minoria de escolas onde este problema das substituições é resolvido a contento. Porque os Conselhos Executivos são melhores gestores? Talvez. De facto, se o assunto for estudado sob a óptica das turmas e não dos docentes; se os docentes forem obrigados a avisar a escola da sua falta -- há telemóveis e e-mails para isso! -- a situação não é muito complicada. Um professor pode dar duas horas suas, extra, a duas turmas que são também suas e, no caso de o colega agora impossibilitado poder, este dará, em dia a combinar, as suas duas aulas em falta.
Para terminar este longo arrazoado, não posso deixar de registar o quanto me custou testemunhar pessoalmente casos de docentes cujas escolas ficam a trinta ou mais quilómetros das suas casas. Especialmente esses não têm uma vida fácil!

11/19/2005

Start Something!

Este é um pequeno texto com alguma história, que terei prazer em vos contar se o "Start Something!" merecer a vossa leitura. Desconheço o seu autor. Sei, no entanto, que o retirei de uma publicação.

Throughout history
most great
civilizations that
have declined
were victims of
stagnation rather than
conquest.
Apathy,
indifference,
detachment
led to decay.
In every country today
we find more people who
prefer the role of
spectator rather
than participant.
Whenever a problem arises,
The spectator asks,
"Why don't they do something?"
They can't help the police
to maintain law and order.
You can!
They are not responsible
for the conditions of your schools.
You are!
They can't give your community
good government.
You can!
Every civic group,
every business,
every sports club,
every good tradition,
every worthwhile institution
began with a need,
a vision
turned into reality by someone
alive, responsible
and innovative.
To the people who sit back and
ask,
"Why don't they do something?"
we ask,
"Why don't you?"

11/16/2005

Quem só olha para a Ota, não vê a batota

Se Portugal tem cerca de 15 milhões de fogos para 10,5 milhões de pessoas; se muitos desses fogos estão devolutos (embora se continue a construir abundantemente); se os preços da habitação não baixam apesar do excesso de oferta -- tudo se deve certamente ao facto de o sector da construção civil ser não só muito forte em Portugal como até desmesurado para o país que temos. Ora, quem é forte constitui, obviamente, um grupo de pressão que lhe permite exercer melhor o seu poder. A necessidade de uma ininterrupta série de obras públicas, por um lado, e de novos terrenos para negócios ligados ao sector imobiliário, por outro, são factores que se auto-justificam, segundo os interessados, para manter activo um sector que, dirão, emprega milhares e milhares de trabalhadores (os eternos desvelos sociais do patronato).
Creio que a questão do aeroporto da Ota se enquadra perfeitamente no panorama acima esboçado. A Ota significa, para o sector, o jogar em dois ou três tabuleiros ao mesmo tempo, ganhando em todos. Curiosamente, tanto a TAP como a Portugália, as duas linhas aéreas que mais utilizam os aeroportos em Portugal, já se manifestaram contra o abandono do actual aeroporto da Portela. Uma parte substancial da opinião pública está contra despesismos estatais, numa época de contenção, e não entende a razão do projecto. O Euro-2004, que registou uma afluência de aviões muito superior ao normal, provou à evidência que a Portela está pronta a resistir por muitos e bons anos a partidas e chegadas. Por outro lado, o facto de uma cidade como Lisboa possuir um aeroporto perto do centro representa um trunfo em termos de qualidade. A presente localização é decerto muito mais cómoda para os passageiros do que uma outra que os obrigue a percorrer cerca de 80 quilómetros (ida e volta) em estradas com trânsito intenso.
À luz destes factos, que são dificilmente contestáveis, é legítimo perguntar-se por que razão se insiste tanto na Ota ou, já agora, noutro local qualquer, que pode até localizar-se do outro lado do Tejo? Basicamente porque o sector da construção civil, ele próprio grande financiador dos partidos políticos segundo consta, se encontra neste momento ávido de obras públicas vultosas como esta do novo aeroporto, que necessariamente implicará ainda a construção de novos acessos. Mas, mais importante que tudo, o sector cobiça há muito os valiosíssimos terrenos hoje ocupados pelo aeroporto da Portela.
Lembremo-nos da campanha que, há anos, foi lançada contra o Hospital Júlio de Matos, que ocupa uma vasta área na zona da Avenida do Brasil. Foi repetidamente afirmado por comentaristas, que pareciam estar fazer o jogo do lobby, que uma unidade do tipo do Júlio de Matos possuía uma dimensão que não fazia qualquer sentido nestes novos tempos. O tratamento de doentes mentais fazia-se modernamente em unidades de pequena dimensão, espalhadas por vários locais. A proximidade do aeroporto, dizia-se ainda como argumento, não permitia que os doentes descansassem verdadeiramente. Tanta preocupação com os pacientes fazia enternecer a alma mais empedernida. Na realidade, porém, os amplos espaços do Júlio de Matos eram apenas alvo de elevada cobiça para construção de mais umas torres de luxo. Quanto dinheiro não se poderia fazer ali? Loucos eram os que estavam no hospital, não os cabeças do sector!
Hoje em dia, mantém-se o mesmo argumento do barulho das aeronaves. E em prol das indefesas populações das proximidades que, por acaso, nunca fizeram abaixo-assinados contra esse facto. Sintomaticamente, as novas construções nas imediações do aeroporto prosseguem, apesar do "ruído ensurdecedor" provocado pelos aviões que as sobrevoam. Está a fazer-se, por assim dizer, o cerco ao aeroporto. A área das Galinheiras, a seguir à Ameixoeira, está a ser objecto de um enorme projecto urbanístico. Mais uma vez, surge como interessante que o local fique situado nas proximidades do aeroporto. Arranja-se assim mais um argumento futuro para a poluição sonora causada pelas aeronaves, como se estas tivessem começado a sobrevoar aqueles locais depois de as construções terem sido feitas!
A Ota surge aos meus olhos como um caso típico de exercício de poder por parte de um núcleo que é amplamente sustentado pela banca e por sociedades financeiras. Trata-se de um sector insensível a outros argumentos que não sejam o do lucro, fácil e contínuo. Barulho mais ensurdecedor que o dos aviões é o produzido pelos estafados argumentos da construção civil. Poderei estar enganado, mas estou sinceramente convencido de que a Ota é apenas mais um caso de pura batota. Para culminar, veja-se o caso da linha do Metro prevista para o aeroporto da Portela. Faz algum sentido que, numa altura em que se pensa desactivar o aeroporto, se gastem rios de dinheiro na construção dessa nova linha? Porém, se for para valorizar o imobiliário que vai ser construído na zona, então já fará todo o sentido.

11/15/2005

Contradições

Durante a minha vida de professor de línguas (aplicadas a diversas áreas), tive ocasião de pôr alunos adultos a jogarem "O Álibi". Trata-se de um jogo interessante, tanto do ponto de vista linguístico como sociológico. Dois alunos, suspeitos de terem roubado uma joalharia, saem da sala de aula para prepararem o seu álibi, enquanto os que estão na sala preparam as suas perguntas. Como cada um dos suspeitos reentra sozinho na sala para ser interrogado pelos "polícias", é relativamente fácil demonstrar, através das respostas contraditórias de um e do outro a algumas perguntas mais subtis, que estão a mentir. Darei pormenores do jogo a quem estiver eventualmente interessado, mas o que me interessa salientar hoje aqui é que os alunos que estão na sala adoram fazer o papel de polícias. Questionam e questionam os suspeitos! Contudo, todos esses alunos admitem que, no geral, a polícia não cabe no mundo dos seus amores. Este aparente paradoxo é interessante e humano. É que se formos nós os polícias, a coisa é diferente!
Trago este assunto à baila a propósito de uma parte do último "Prós e Contras" televisivo sobre Imigração. A certa altura, a apresentadora sugeriu que, aparentemente, a situação ideal seria a de os trabalhadores imigrantes virem para as grandes obras, quando as há, e abandonarem o país após a prestação do serviço. Sobreveio uma revoada de aplausos, espontâneos, de uma plateia maioritariamente constituída por portugueses não descendentes de imigrantes.
O que os membros da plateia consideraram correcto foi, nem mais nem menos, a precariedade do emprego, algo que decerto detestariam para si próprios. Quando, há umas décadas, as empresas transformaram as suas consagradas Secções de Pessoal em Departamentos de Recursos Humanos, elas passaram a considerar as pessoas como meros recursos, só que humanos. Combustíveis, produtos químicos, madeira, etc. são os recursos materiais de que as empresas carecem para a sua laboração. A diferença relativamente a nós é que somos pessoas. Para as empresas, é ideal a situação em que conseguem que uma percentagem razoável dos seus "recursos humanos" possam ser dispensados depois dos picos de produção, eventualmente para serem chamados de novo quando a laboração recomeçar em pleno. As pessoas passam, assim, a ser mais uma ferramenta de gestão. JIT -- just in time.
Ora, foi esta situação, que para si próprios não apreciariam, que as pessoas da plateia aplaudiram quanto aos imigrantes. Admitamos que somos muito assim. Quando toca a nós, é uma coisa, quando o assunto é de outros, a opinião já é diversa. Não é assim também com os professores, que gostam de avaliar os outros mas detestam serem eles próprios os avaliados?
É por motivos desta ordem também que, se formos eventualmente detentores de acções de uma empresa que acabou de despedir três mil trabalhadores "redundantes" para aumentar a sua produtividade e, com isso, viu o valor das suas acções bolsistas disparar, rejubilamos com o nosso ganho e ignoramos por completo o que deu azo a essa súbita subida. Somos humanos. Nem mais, nem menos. É por isso que consideramos a doutrina de Cristo apenas como lindos preâmbulos éticos para o articulado das leis que nós próprios vamos elaborando.

11/14/2005

Lobisomens

Há tempos vi num programa de televisão algo que desconhecia e considerei fascinante. O programa era sobre lobisomens. A palavra evoca-me Trás-os-Montes, região acerca da qual era vulgar dizer-se que "é uma terra em que as mulheres são homens e os homens lobisomens".
Na realidade, em Trás-os-Montes como em tantas outras terras da Europa, existiram "lobisomens" nos séculos XV, XVI e possivelmente até muito mais tarde. Investigações relativamente recentes conduzidas por uma cientista norte-americana levaram à conclusão de que os lobisomens tendiam a surgir em regiões de gente pobre e com cultivo e produção de centeio. Constatou-se que o centeio pode conter um fungo -- ergot -- que é alucinogénico. O ergot é, de resto, usado em numerosos alucinogénicos. Este fungo forma-se no centeio próximo da altura em que o cereal está pronto a ser colhido. Quem o colhe não repara nele e, mesmo que notasse, se fizesse pão utilizando esse centeio o pão passaria a conter o ergot, que resiste à cozedura. Daí à ingestão do pão em largas quantidades -- como é timbre das famílias pobres -- e à sugestão real dada à pessoa de que possuía força sobrenatural era um passo.
Para o restante da população, esses lobisomens eram vistos como estando possuídos pelo demónio. Se a descoberta da cientista tivesse ocorrido há quatrocentos anos, ter-se-iam evitado muitas mortes -- e muitas histórias fantásticas.
O programa não fazia qualquer alusão concreta a Trás-os-Montes nem a Portugal, embora mencionasse outras regiões da Europa. Para mim é evidente a possível transferência para o nosso nordeste.

11/13/2005

TNSC

Um bem-haja ao João Miguel, também conhecido no mundo da blogosfera por João Ratão, por ter organizado para hoje uma visita aos bastidores do S. Carlos, que teve fortes motivos de interesse. As 22 pessoas que nela participaram tiveram oportunidade de conhecer em pormenor praticamente todas as secções do Teatro Nacional de S. Carlos, de visitar os locais mais conhecidos e os mais recônditos, receber explicações vivas, informativas e detalhadas. Uma visita assim, de 120 minutos, não acontece todos os dias.

11/09/2005

Aplauso

Duas notícias recentes aumentaram um pouco o meu capital de esperança na correcção de situações injustas. Uma delas diz respeito a uma sentença jurídica que condenou três empresas por abate ilegal de sobreiros para fins de construção. Se a sentença lhes tivesse aplicado apenas uma coima, o caso seria vulgar. Seria aquilo que geralmente se classifica de situação em que o crime compensa. Contudo, o tribunal determinou que, para além do pagamento de uma coima, as empresas teriam que replantar os sobreiros abatidos e, mais relevante do que tudo, ficavam impossibilitadas de efectuar construções naqueles terrenos por um período de 25 anos. Assim, admitamos, o crime começa a não compensar. É o Estado de Direito a funcionar.
A segunda notícia informa que o código de conduta aprovado pela Apifarma determina que os laboratórios farmacêuticos não poderão oferecer aos seus clientes prendas de valor superior a 25 euros nem patrocinar congressos fora de Portugal. Ficam proibidas vantagens pecuniárias ou benefícios em espécie aos profissionais de saúde que os incentivem a receitar, fornecer, vender ou administrar medicamentos. A violação destas regras é punida com advertência, multa ou expulsão da Apifarma.
Este é um bom caminho.

11/08/2005

Uma questão

Se não o fizeram ainda, dêem uma espreitadela ao endereço http://www.blogsearch.google.com/. Quando aparecer "Pesquisa de blogs", escrevam na respectiva caixa azweblog. Reparem que surgem cerca de 50 entradas nossas, dispostas "por ordem de relevância". Quem determina esta ordem? Que palavras incluídas nos blogs são consideradas relevantes para a busca e ordenação automática?

11/07/2005

Histórias à volta de um teimoso défice

Imagine-se pai ou mãe de uns três viçosos filhos, todos a estudar. O ano correu-lhe economicamente bem, foi aquilo a que se chama um ano de vacas gordas. Já o ano anterior tinha sido muito razoável. Você decidiu colocar os seus três filhos numa das melhores escolas de Lisboa. Aumentou-lhes também a mesada dos 100 euros habituais para 300 euros. Nivelou por cima, porque admite que o mais novo não precisa desse montante, mas não quis fazer descriminações. Viajou, ainda, pela Europa com toda a família no novo carro, o qual vai pagar a prestações. Uma entrada para uma casa nova, que ainda não está pronta, foi o seu acto de maior relevo. Tudo foi feito com a intenção de dar satisfação à família e a si próprio.
A crise económica que agora aí está não era exactamente esperada. Mas está aí. Você entrou em dificuldades. Tem um fundo de reserva mas, se as coisas continuarem assim, ele esgotar-se-á num ápice. Você tem os seus compromissos fixos: a casa, o carro, a escola dos garotos. Até a mesada! "Quem é que me mandou aumentá-la? Devia estar a dormir quando fiz isso!"
São assim as coisas nas famílias. Podem ser assim, também, no governo de uma nação. Quando não se aproveita os anos das vacas gordas para juntar umas reservas que dêem para os anos maus e, pelo contrário, se assinam compromissos que há que cumprir, a coisa pode tornar-se preta. É verdade que os governos têm que apresentar todos os anos um orçamento aos deputados e que estes o devem aprovar. Mas, com votos contra e abstenções, ele passa na mesma. Por outro lado, um orçamento nunca diz tudo. Tem muita coisa encapotada, coisas que só anos depois, quando já são outros os governantes, se vêm a descobrir.
A pergunta mais importante a colocar é: pode gastar-se mais do que aquilo que se arrecada? Pode, claro que sim, mas não se deve. A excepção será quando aquilo que se gasta a mais irá ter um valor reprodutivo certo num futuro próximo. É o chamado défice virtuoso. Outra pergunta que deve ser colocada: por que razão se irá gastar de mais? No seu caso, acima, era para dar satisfação à família. E no caso do Estado? Bem, será muitas vezes para parecer mais um Midas do que um verdadeiro gestor, que quer agradar a um maior número possível de pessoas para que essas mesmas pessoas, como votantes, possam garantir a sua reeleição. O poder é algo que um governo detesta perder.
Publicou há dias o jornal Público uma interessante análise dos défices registados entre 1980 e 2004. Não houve ano que não apresentasse défice. Para começar, deverá estranhar-se a existência invariável desse défice. Então não é verdade que, para mais, fomos o país mais ajudado pela União Europeia através de diversos fundos? É. Mas quando se trata de dinheiro fácil, também fácil se torna gastá-lo. Além daquela história das reeleições. História que é decisiva.
Nestes últimos 24 anos, os défices mais baixos ocorreram em 1999 e 2000. Foi aquando da nossa candidatura ao euro. O governo declarou défices de 2,9 por cento, resvés com o máximo permitido: 3 por cento. E os mais elevados? Bem, esses chegaram aos 9 por cento (!) e ocorreram em 1981 e 1985. Em 1981, na sequência da morte de Sá Carneiro houve várias eleições. Em 1985 foram concedidas múltiplas benesses. Dois anos depois, com importantes eleições legislativas a realizarem-se, o défice atingiu outro número elevado: 7,2 por cento. Em 1991, quatro anos depois, com novas eleições para o parlamento, o défice pulou para 7,6 por cento. Este pai a gastar o que não podia nem devia! E ele que, como primeiro-ministro, até devia saber, porque a sua formação era em Finanças e gabava-se disso. Dir-se-á: não se seja injusto! Então, e as crises económicas? Qual crise económica! As condições de escudo baixo e petróleo barato até davam para produzir e vender mais! E, na realidade, verifiquemos que houve sempre um saldo positivo do lado económico, o famoso PIB: em 1981 foi de 1,6 por cento, número que em 1985 cresceu para 2,8 por cento, em 1987 cresceu ainda mais para 6,4 e em 1991 desceu, mas para uns ainda confortáveis 4,4 por cento. Pois mesmo assim o Estado gastou mais do que arrecadou!
Quando chegar a factura para pagar, o que virá a suceder a partir do ano que vem, ela será pesada. E longa na sua duração.
Esta é uma breve história que ilustra como o amor é cego. Tanto o amor aos filhos como ao poder. Um tem laços sanguíneos e desculpa-se mais. O outro não tem perdão. É também um dos pontos fracos do regime democrático.

11/06/2005

Falta de notícias que incomoda

Se há uns quinze dias fomos alertados pelos media para um alegado sistema de fraudes, envolvendo a banca e lesando o Estado, num montante de causar verdadeiro alarme, presentemente estamos a ser objecto do mesmo silêncio que se ergueu desde Maio sobre uma propriedade na zona da Companhia das Lezírias onde se procedeu a um abate de sobreiros, numa alegada acção promíscua entre governantes do CDS e o BES. É em nome do segredo de justiça que de súbito se eleva este muro de não-informação? É a favor do bom nome da economia nacional e do seu sistema financeiro? Ou é em puro desrespeito pela democracia e pelos direitos dos cidadãos-que-só-servem-para-botar-o-voto-na-urna?

11/04/2005

Matriz de Acontecimentos (3 Novembro 2005)

Continuo a aceitar inscrições para uma visita aos bastidores de São Carlos, a efectivar às 12h15 do domingo 13 de Novembro.

Se ainda não viu, não perca o filme que está em exibição (até dia 9, para já?) no Nimas, na 5 de Outubro. Eu segui, e confirmo, a opinião de Carvalho de Oliveira no nosso blog no dia 28.

Acaba no domingo, dia 6, o XXV Festival Nacional de Gastronomia de Santarém, o XVI Festival Internacional de Banda Desenhada da Amadora e os XIII Encontros de Coros Amadores do Concelho de Oeiras.

De 8 a 13, Festival Internacional de Chocolate de Óbidos (fecha às 23h, último dia 20h). Aproveite para ver a exposição do José Aurélio.

Sexta-feira, dia 4:

às 21h30, no Auditório Municipal Eunice Muñoz, Oeiras, Música de Câmara com o Moscow Piano Quartet, integrado no Festival Península de Músicas.

Sábado, dia 5:

às 15h00, início dos circuitos de autocarro para visita às Galerias com inaugurações no âmbito da LISBOARTE (marcação pelo 21 356 78 00)

às 15h00, nas novas instalações do Museu da Música Portuguesa (na Casa Verdades Faria, no Monte-Estoril) conferência por Teresa Cascudo ?Por que é que a Nona Sinfonia é o hino da União Europeia";

às 21h30, no Auditório Municipal Eunice Muñoz, Oeiras, recital de canto e piano com Ana Ester Neves (soprano) e João Paulo Santos, integrado no Festival Península de Músicas.

Domingo, dia 6:

às 10h00, na Rádio Baía, 98,7 MHz, Carlos Pinto Coelho entrevista Pedro Almeida Vieira.

às 12h00, no CAMJAP (?Centro Arte Moderna da Gulbenkian?) visita temática do ciclo ?Primeiro Contacto? ?Uma Introdução à Colecção do CAMJAP - Arte Portuguesa na Segunda Metade do Século XX? por Hilda Frias.

Segunda-feira, dia 7:

às 18h00, na Gulbenkian, ciclo de conferências ?Ao Encontro da Medicina?, Duarte Nuno Vieira (Faculdade de Medicina de Coimbra) ?Como Saber Quem Éramos: Identificação e ADN, História e Catástrofe?;

às 19h30, no Trem Azul Store Jazz (Rua do Alecrim, 21 A), concerto de aniversário

às 23h30, na 2:, Ana Sousa Dias vai conversar com Marco Martins e Nuno Lopes.

Quarta-feira, dia 9:

às 10h00, na Gulbenkian, ciclo de conferências ?8º Fórum Gulbenkian de Saúde?, Debora Spar ?Os Ganhos da Promoção em Saúde?;

às 18h00, na Gulbenkian, ?As Forças da Natureza?, por João Paulo Silva, do ciclo ?À Luz de Einstein 1905-2005?;

às 18h00, na Culturgest, conferência do ciclo ?Óperas (mal) amadas do Século XX?: Der ferne Klang (1912) de Krank Schreker (1878-1934), por Carlos de Pontes Leça.

A seguir:

11 a 29 de Novembro, Guimarães Jazz

11 a 20 de Novembro, London Jazz Festival

13 de Novembro, Teatro de São Carlos segundo dia do ciclo ?Europa em Música?, dedicado a Itália!!! Por 5?, poderá assistir a um, a dois ou a todos os concertos programados: 11h00 no Salão Nobre, 15h00 no Foyer e 17h00 no Salão Nobre.

25 de Novembro, às 22h45, na Aula Magna: Jacinta

Download do ficheiro das Sugestôes (03 Novembro 2005)

Bom fim-de-semana

JMiguel

11/03/2005

Dantes havia apenas a Travessa do Fala-Só

Telemóvel, télelé, trelamóvel, celular, seja o que for, já estamos tão habituados que nem ligamos. Mas muita gente liga, e gasta boas somas palrando em longas conversas fiadas. No verão passado, vi uma participante num passeio pedestre nocturno de cerca de 10 quilómetros empunhar o dito sensivelmente ao quilómetro 3 e não parar de falar até chegar ao fim do percurso. Fez dois passeios paralelos.
Ultimamente, a situação tem-se alterado. Desconheço se a tecnologia usada é bluetooth com um auricular, o certo é que cada vez encontro mais fala-sós. Estarão obviamente a falar com alguém, mas a falta do télelé na mão desorienta o espectador à primeira vista. Ainda hoje, num autocarro meio-vazio, deparei com uma senhora que, de uma situação de quietude total, passou a certa altura a falar desalmadamente alto e a fazer montes de gestos, enquanto olhava de soslaio para a sua própria imagem reflectida na vidraça. Acredito que tenha havido pessoas no transporte que duvidaram da sanidade mental daquela fala-só. O problema é que qualquer dia, ao vermos alguém nas proximidades do Júlio a falar sozinho, vai-nos assaltar a terrível dúvida: cliente do JM ou apenas um telesolitário?