11/12/2004

Feminismo linguístico precisa-se!

Ingleses e americanos concordam, dentro da era do politicamente correcto, que a sua língua possui alguma orientação excessiva para o masculino. Assim, palavras como "mankind" e "Mrs" têm vindo a ser substituídas respectivamente por "humanity" e "Ms". Humaniza-se "mankind", cujo elemento "man" não pode representar homem e mulher. Quanto a "Ms", substitui tanto "Mrs" como "Miss", pois se um homem não vê a sua condição de casado expressa por uma designação prévia -- "Mr" mantém-se para homem solteiro ou casado -- , por que razão não deverá o mesmo acontecer com uma mulher?
Dentro da mesma linha, também "chairman" tem vindo a perder popularidade, sendo frequentemente substituído por "chairperson", termo que acomoda com maior facilidade masculino e feminino.
Basta considerarmos alguns pares de palavras como master/mistress, bachelor/spinster, courtier/courtesan, para vermos que existe uma conotação depreciativa clara nos termos femininos. (Aliás, mesmo em português o último dos pares -- "cortesão/cortesã" -- introduz uma conotação negativa no feminino que o masculino não possui.) Expressões como "to each his own" ("a César o que é de César") ao incluírem "his" trazem toda a conotação para o masculino. E o que se poderá dizer de chamar aos antepassados "forefathers", relegando as "mothers" para um injusto oblívio? Uma expressão como "man-made changes" esquece igualmente o papel, quantas vezes decisivo, das mulheres.
Se os americanos e britânicos pensam isto da sua língua, o que diriam se estudassem o português? No nosso idioma, o elemento feminino é claramente ignorado num vastíssimo número de casos. Notem-se expressões que empregamos todos os dias, como "os meus pais", "os meus irmãos" ("my brothers and sisters", em inglês), "os meus tios" ("my uncle and aunt"), "os meus sobrinhos". Deixar as mães, as irmãs, as tias e as sobrinhas de fora parece ser uma questão de somenos para os portugueses. Na realidade, este facto mostra apenas que o homem, como elemento pretensamente dominante da sociedade, coloca a mulher num injusto segundo plano. Dizer "os reis de Portugal" inclui obviamente (?!) as rainhas, mas elas não se vêem na expressão, só eles. Frases em que o termo "homem" engloba conceptualmente as mulheres mas despreza-as nominalmente são inúmeras. Dois exemplos apenas: "O homem põe, Deus dispõe", "O Natal é sempre que um homem quiser".
Só para concluir: não é aviltante que a enunciação das pessoas verbais se faça sempre pela ordem "eu", "tu", "ele", "ela", "nós", ... colocando a mulher invariavelmente depois do homem? Talvez a língua portuguesa esteja a precisar de um abanão!

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