5/30/2011

Números diferentes

Poucas coisas me dão tanto prazer como ouvir histórias curiosas de pessoas simples. São histórias que demonstram uma sageza especial e uma vivência nem sempre fácil.
Há dias, estive uns minutos em animada conversa com uma vendedora da praça que conheço há muitos anos. Mulher que está hoje na casa dos setenta, ela costumava vender fruta na rua com o seu carrinho de mão. Porém, quando a polícia começou a andar atrás dos vendedores ambulantes, ela não teve outro remédio senão alugar uma bancada na praça e lá se instalar.
Lembro-me das vezes em que a via colocar para os seus clientes "fruta da boa" num saco preto de plástico, que depois pesava. Quando uma vez lhe perguntei por que motivo os sacos que ela usava - e as companheiras que andavam também a vender fruta na rua - eram sempre daquela cor, ela não mentiu: "Às vezes temos uma maçã ou laranja menos boa e pomo-la logo no fundo do saco. Ora, como o saco é preto não se vê. Não podemos ser só nós a ficar com o prejuízo. Comprámos a fruta como boa, mas já sabemos que uma ou outra peça vem tocada. Assim, distribuímos o mal pelas aldeias." Consciência tranquila, portanto. Isto já é o passado de venda na rua, porém.
Na bancada da praça é diferente. O cliente pode geralmente servir-se a si próprio. Há, evidentemente, algumas excepções, nomeadamente quando um determinado tipo de fruta é mais perecível e não resiste muito ao toque ou ao apalpar mais forte dos fregueses. Nesses casos, é a vendedora que coloca a fruta, seja no saco – que agora já não é preto – ou numa caixa. Embora nem sempre, há alguma marosca feita pela vendedora que continua a existir. Eu diria que lhe está na massa do sangue.
Confesso, entretanto, que a admiro pela vida difícil que leva, por saber que com a sua idade vai buscar fruta durante a madrugada ao mercado abastecedor e conduz ela mesma a sua carrinha. Notável!
E qual foi a última história que lhe ouvi? Queixava-se ela da coluna: já não conseguia carregar caixas pesadas. Nada de mais natural! Tinha geralmente o filho, motorista de táxi, para ajudar na carga e outro homem para a descarga, já na praça. Da queixa do seu mal na coluna passou à doença que teve aos 3 anos e ao acidente alguns anos depois. A doença foi uma paralisia que lhe afectou todo o lado esquerdo; o acidente foi com um automóvel, que a atropelou e lhe partiu os ossos da bacia. Seis meses no hospital após a operação. E sobreviveu assim, com aparente saúde? "O trabalho dá saúde!" disse-me ela. Pois sim; mas a paralisia não evitou que ela ficasse com a coluna um pouco torta e com um braço e uma perna mais atrofiados. Até um pé é maior do que o outro. "Num pé calço 37, no outro 38." E como é que faz para comprar sapatos?, perguntei-lhe. Não há pares de sapatos com dois números diferentes. "Ah, isso nunca me atrapalhou. Entro numa sapataria ou então numa feira e peço para ver uns sapatos 37 e outros 38. Lembro que nem todos os fabricantes têm as mesmas medidas. Depois, com várias caixas à minha frente, compro os sapatos de que mais gosto, mas tenho sempre o cuidado de tirar um 37 e um 38. Até hoje nunca falhou!" Chamei-lhe a atenção para o facto de ela prejudicar o vendedor, que ficava com sapatos desirmanados. "Que tem isso? Deus já me castigou tanto durante a vida que de certeza me perdoa isto! Se me vejo obrigada a enganar este bocadinho, afinal é por culpa dEle." E pronto. Consciência limpa e tranquila.
As desculpas que nós geralmente arranjamos para as nossas acções menos éticas não têm fim. Esta vendedora de fruta está em óptima companhia.

5/22/2011

Poesia de A a Z

Para a letra F, um poema de David Mourão-Ferreira:


E por vezes

E por vezes as noites duram meses
E por vezes os meses oceanos
E por vezes os braços que apertamos
nunca mais são os mesmos E por vezes

encontramos de nós em poucos meses
o que a noite nos fez em muitos anos
E por vezes fingimos que lembramos
E por vezes lembramos que por vezes

ao tomarmos o gosto aos oceanos
só o sarro das noites não dos meses
lá no fundo dos copos encontramos

E por vezes sorrimos ou choramos
E por vezes por vezes ah por vezes
num segundo se evolam tantos anos.

5/20/2011

Não são castelos em Espanha, são aeroportos




As populares aventuras de Dom Quixote de la Mancha e o elevado número de fortificações que existem por toda a Espanha, país que ao longo da sua história teve lutas contra muitos povos e regiões vizinhas, fez com que a expressão inglesa correspondente à portuguesa de fantasiar, sonhar acordado ou fazer castelos de cartas seja to make castles in Spain.
Ora, se é verdade que os castelos há muito deixaram de ter a sua importância como refúgio seguro – a artilharia, por um lado, e a aviação, por outro, tornaram-nos meros sítios de interesse turístico – a expressão que nos fala de "castelos em Espanha" mantém-se até aos dias de hoje. Mais terra-a-terra e com interesses económicos e financeiros, surgiu entretanto uma nova Espanha: a das estradas e dos aeroportos.
Há dias, um amigo enviou-me um ficheiro electrónico interessante sobre o aeroporto de Ciudad Real. Vi-o, e perguntei-me a mim próprio se aquilo era mesmo assim ou havia ali mãozinha de manipulação dos media. De facto, as imagens que recebi eram relativas a um aeroporto enorme, moderno e muito bem apetrechado, concebido para alternar com o Barajas de Madrid, mas a que faltava o essencial: aviões e passageiros. Esse era o escândalo que o anexo do mail apontava: tanto dinheiro gasto, instalações excepcionalmente boas e, depois, movimento nulo.
Afinal, parece que as minhas dúvidas sobre a possibilidade de manipulação das imagens não tinham grande razão de ser. O jornal Público de ontem inclui um despacho do seu correspondente em Espanha, Nuno Ribeiro (N.R.), que se refere ao assunto. De uma forma bem mais alargada, diga-se. Conta-nos N.R. que entre os aeroportos controlados pela empresa pública AENA, na dependência de executivos autonómicos ou sob a égide de privados, o número ultrapassa as cinco dezenas. Eis alguns exemplos de um descalabro recente.
O aeroporto de Castellón foi inaugurado em 25 de Março deste ano. A pista não tem aparelhos e não tem igualmente autorização de navegação aérea. A obra, que foi edificada por uma sociedade pública participada pela Comunidade Valenciana – que possui o sexto maior défice das 17 comunidades espanholas – custou 150 milhões de euros.
Do aeroporto de Huesca levantou em 3 de Abril passado o último avião comercial do ano com destino a Londres. O aeroporto foi inaugurado em 2007 e custou 57 milhões de euros ao erário público.
Mas há mais. O aeroporto de Lérida foi inaugurado em 2010 por iniciativa do Governo da Catalunha, que apresenta o quarto maior défice autonómico. O aeroporto custou 104 milhões de euros e só tem duas rotas, e estas operam apenas aos fins-de-semana.
O aeroporto de Ciudad Real, a que acima me referi, foi fruto da iniciativa privada, financiada pela Caixa de Castela-la-Mancha (CCM), por sua vez controlada pelo governo autonómico. O Banco de Espanha teve de intervir na CCM. Castela-la-Mancha é a comunidade que registou o maior défice em Espanha.
As várias pistas sucederam-se sem critérios de rentabilidade, o que implicou enormes prejuízos operacionais. Na realidade, menos de um terço das pistas espanholas geridas pela AENA respeitam os parâmetros mínimos que os peritos colocam entre três e cinco milhões de passageiros/ano.
Múltiplas capitais de província de média dimensão possuem um aeroporto. O caso mais saliente será o facto de num raio de 125 quilómetros à volta da pista de Burgos existirem cinco aeroportos, em Logroño, Vitória, Bilbau, Santander e Valladolid. Nuno Ribeiro termina o seu apontamento lembrando que, no ano passado, o aeroporto de Albacete recebeu 11290 viajantes provenientes de 1243 ligações, o que dá uma média de nove passageiros por voo!
Lições a colher? Muitas. Lá como cá, com certeza que os bancos e as construtoras, que podem ganhar bom dinheiro com a construção destes aeroportos, saem cá para fora com previsões de movimento das pistas muito diferentes – para mais - daquele que mais tarde efectivamente se regista. Não foi praticamente o mesmo que sucedeu cá com o TGV relativamente ao número de passageiros previstos? E a rocambolesca história da Ota, que sempre foi batota no sentido de que aquilo que verdadeiramente interessava ao sector imobiliário era ver o actual aeroporto de Lisboa desimpedido tão cedo quanto possível para que naquela imensa área se pudesse começar a construir ambiciosos edifícios. Presentemente vão ter que esperar. E muito. Em Espanha também. Entende-se agora melhor o descontrolo das contas públicas através das regiões autónomas, como entre nós sucede com a ilha da Madeira. A construção dos aeroportos e de outras estruturas está em linha com os altos voos que os respectivos governos ousaram fazer apesar de não possuirem meios financeiros para tal.

5/17/2011

Assédio sexual e justiça

A acusação de assédio sexual feita em Nova Iorque ao Presidente do FMI, que levou a que o avião em que ia partir fosse retardado para que Strauss-Kahn fosse conduzido à prisão, veio mostrar mais uma vez que é frequente que países diferentes tenham costumes diversos. Este é um caso que, noutra área, me faz lembrar um estudo feito há anos por uma médica americana. Ela percorreu meio mundo colhendo inúmeros dados para chegar à conclusão de que o tratamento a uma dada doença depende mais do país em que o doente está do que da doença em si.
Aqui também, ouso dizer, sem grande margem para dúvidas, que se o que sucedeu em Nova Iorque tivesse ocorrido em Lisboa, Strauss-Kahn teria sido alvo de um tratamento bem diferente. O que me leva a esta conclusão é não só o conhecimento da morosidade da nossa justiça, a que se junta um certo respeito por VIPs que o sistema judicial português tem geralmente denotado. É que, para além de tudo isso, há a recente absolvição do dr. Vilória, descrita há dias por Francisco Teixeira da Mota no jornal Público.
Vilória é médico psiquiatra e acompanhava já há alguns meses uma doente de 30 anos, grávida, que sofria de depressão. Segundo foi dado como provado no tribunal de 1ª instância, a paciente em questão estava na sua 34ª semana de gravidez quando, numa consulta, começou a chorar. Nessa altura, Vilória disse-lhe para se deitar na marquesa, o que a doente fez; Vilória começou então a massajar-lhe o tórax e os seios e a roçar partes do seu corpo no corpo da paciente. Esta levantou-se da marquesa e sentou-se no sofá. Vilória foi passar uma receita; quando voltou, aproximou-se da Joana, exibiu-lhe o seu pénis erecto e meteu-lho na boca, para tanto agarrando-lhe os cabelos e puxando-lhe para trás a cabeça, enquanto lhe dizia "estou muito excitado" e "vamos, querida, vamos". A doente reagiu, levantou-se e tentou dirigir-se para a porta de saída; no entanto Vilória agarrou-a, virou-a de costas, empurrou-a na direcção do sofá, baixou-lhe as calças (de grávida) e introduziu o pénis erecto na vagina, até ejacular.
Face a estes factos, dados como provados, considerou o tribunal de 1ª instância que Vilória cometera um crime de violação, condenando-o a uma pena de cinco anos de prisão, suspensa por cinco anos e ao pagamento de uma indemnização à vítima no montante de 30 mil euros.
Pois, pasme-se! O Vilória interpôs recurso, pedindo a sua absolvição. E não é que o Tribunal da Relação do Porto lha concedeu! De facto, até a indemnização à vítima lhe foi perdoada! Para os desembargadores – com a excepção do juiz presidente da secção que votou vencido – o acto de agarrar a cabeça não era um acto de violência de modo a constranger a paciente à prática de um acto contra a sua vontade.
Esta é uma história incrível, ocorrida no passado mês de Abril. Quem duvida que Dominique Strauss-Kahn teria seguido viagem calmamente para o seu destino se a cena novaiorquina tivesse ocorrido em Portugal?!

5/16/2011

Poesia de A a Z

Para a letra E, um soneto de Florbela Espanca:


Conto de Fadas

Eu trago-te nas mãos o esquecimento
Das horas más que tens vivido, Amor!
E para as tuas chagas o unguento
Como que sarei a minha própria dor.

Os meus gestos são ondas de Sorrento...
Trago no nome as letras duma flor...
Foi dos meus olhos garços que um pintor
Tirou a luz para pintar o vento...

Dou-te o que tenho: o astro que dormita,
O manto dos crepúsculos da tarde,
O sol que é de oiro, a onda que palpita.

Dou-te, comigo, o mundo que Deus fez!
- Eu sou Aquela de quem tens saudade,
A princesa do conto: "Era uma vez..."

5/13/2011

Quando o antigo colonizador passa a colonizado

Em termos da União Europeia, a diferença que se encontra nos padrões existentes entre alguns países-membros como a Alemanha e Portugal é flagrante. Proponho-me estabelecer algumas distinções entre estes dois países. Porquê? Parece-me lógico: um, por ser o nosso país. O outro, a Alemanha, por ser o incontestado líder da União.
O que é hoje a Alemanha começou por ser um conjunto de vários principados com interesses muitas vezes antagónicos em alguns aspectos. Graças à força e poder de liderança de Bismarck na segunda metade do século XIX, acabaram todos por se unir de maneira a formarem um grande país com uma língua e moeda comuns. Entre vários outros factores de desigualdade que existiam, os principados professavam religiões cristãs com um sentido diferente, do que resultaram lutas entre católicos e protestantes. Ainda hoje, afastadas já que são as guerras religiosas, existem regiões na Alemanha que são predominantemente protestantes e outras católicas. Curiosamente para quem defende a paz e a uniformidade a todo o custo, dessas lutas resultou uma maior liberdade. Porquê? Basicamente porque as águas agitadas conduzem sempre ao levantar de questões e estas, por seu lado, desenvolvem o sentido crítico das pessoas. Fica-se a saber, conscientemente, por que motivo se é católico ou protestante e, dentro deste segundo grupo, se se é luterano ou calvinista, por exemplo. Ou se é ateu. Ou agnóstico. O mesmo sucedeu em Inglaterra, na França, na Holanda.
Pelo contrário, em Portugal nunca houve verdadeiras lutas religiosas. A Igreja católica constituiu um verdadeiro monobloco. A censura instaurada por diversas formas, entre elas através da Inquisição eufemisticamente denominada “Santo Ofício”, controlou sempre quaisquer desvios da religião oficial. São conhecidos os casos de portugueses que, ou por possuírem uma costela judaica, ou por advogarem ideias que poderiam constituir um embaraço para os governantes políticos e religiosos do país, foram remetidos ao exílio da pátria. Noutros países - desde a Inglaterra à Rússia, à França, à Holanda e à Itália -, alguns tornaram-se famosos dentro da sua área, sendo no entanto praticamente ignorados em Portugal. São os “estrangeirados” que, para que o nacionalismo bacoco dos portugueses fosse exaltado, foram virtualmente considerados inimigos da pátria. A falta de liberdade no país e a ausência de espírito crítico que se pudesse manifestar abertamente levou facilmente ao domínio de uns tantos sobre todos os restantes.
A grande clivagem nacional entre ricos e pobres arrasta-se há séculos, geralmente sob a branda complacência da Igreja Católica e dos governantes que ao longo dos séculos vêm dirigindo a nação. Judeus cultos e proeminentes foram expulsos de Portugal, indo enriquecer com o seu contributo outras nações. Do conceito judaico de “povo eleito”, Portugal manteve até hoje cultos profundamente enraizados que nos falam de um paraíso “à beira-mar plantado” e do país como “uma dádiva de Deus a um povo eleito”. Vivendo entre a ficção mítica que o uso da História tão habilmente manipulou e a realidade menos agradável e mais sombria, o povo tem de há muito a consciência de que no país a justiça é, simplificadamente, a justiça dos ricos, e que a corrupção prevalece impune sempre que os VIP estão sob a alçada da justiça. O povo apreendeu também como natural o facto de que aqui “os rios correm para o mar” quando é o deserto que mais precisa da sua água. Pouco instruídos no geral quando comparados com trabalhadores de outros países do norte da Europa, os portugueses parecem possuir melhores qualidades de trabalho quando exercem actividades para si próprios do que quando, por exemplo, servem o Estado. Como sabemos, os trabalhadores portugueses são muito apreciados na Europa pelos empresários e governantes, não só por serem de facto diligentes e bem dotados, como também por se constituírem em comunidades que poucas ou nenhumas ondas de perturbação levantam em países estrangeiros.
Para além de alguns períodos relativamente curtos em que tivemos alguma indústria nacional que se visse – com o Marquês de Pombal, primeiro, e com a nossa entrada na EFTA na segunda metade do século XX - somos basicamente um povo de comerciantes. Compramos para vender. Não totalmente a despropósito, há quem nos chame “os árabes da Europa”. Os nossos centros comerciais são fabulosos, mas infelizmente vendem mais artigos estrangeiros do que portugueses. Os Lusíadas já foram apodados de "a Bíblia do comércio". E quem faz estas comparações? Geralmente pessoas de países protestantes ou de ascendência judaica.
E quanto aos alemães? Bem, esses, talvez pelo posicionamento da antiga (e actual) capital, Berlim, talvez pelas lutas de separação da Áustria católica nas lutas entre Viena e Berlim que esta última acabou por vencer, são mais protestantes do que católicos na sua maneira de ser. Daqui resulta que o que Max Weber refere a propósito da reforma é particularmente interessante e continua válido de uma forma geral: "Quando um sócio do banqueiro Jakob Fugger se aposentou porque já tinha ganho o suficiente e aconselhou Fugger a fazer o mesmo, este classificou a atitude de pusilânime e disse que ele próprio queria trabalhar e ganhar dinheiro enquanto pudesse. Estamos em presença de um cunho ético de conceito de vida. O ganho é considerado como objectivo da vida do homem e não apenas como um meio de satisfazer as suas necessidades materiais."
No que nos diz respeito, creio que na generalidade se pode dizer que somos um povo por natureza desconfiado, que acredita pouco em estranhos e prefere ter empresas dinasticamente familiares a criar grandes empórios de difícil controlo. Aqui somos muito diferente dos alemães, os quais, pela sua cultura própria, pelas características do seu sistema educativo e também pelo clima, não só confiam mais no trabalho de equipa – expulsando sem hesitação quem não seguir as regras do grupo – como tendem a criar empresas de dimensão muito maior.
Razões históricas que se prendem com empreendedoras viagens de exploração marítima e com o comércio dos portugueses com as populações nativas em vastíssimas zonas do Atlântico e do Índico em séculos passados fizeram com que Portugal conseguisse um império que durou vários séculos e se finou em 1974. Aí também, como seria de esperar, imperou o comércio, incluindo o da escravatura. Portugal foi construindo um vasto império de ambos os lados do Atlântico Sul: na América com o vastíssimo Brasil, em África com Cabo Verde, Guiné, S. Tomé e Príncipe e a enorme Angola. Do outro lado de África, já no Oceano Índico, os portugueses fizeram de Moçambique também uma importante colónia. E, ainda, mais longe da metrópole, territórios na Índia, Macau e Timor contribuíram para a riqueza portuguesa.
O grande patrão de tudo isto não eram empresários privados, mas sim o Estado. Os réditos acabavam por vir para a nação, mas posteriormente a sua distribuição deixava muito a desejar. Construíram-se numerosas igrejas e decoraram-se muitas outras com riquezas que incluíam ouro e prata. Quanto ao povo, ele era mantido em grande parte analfabeto. Da afluência de riquezas vindas do Brasil e, mais tarde, das colónias africanas, resultou uma certa indolência nacional, que pouco desenvolveu a ciência e a investigação, ao contrário do que aconteceu na Alemanha, que, embora sem existir ainda como país nem possuir colónias, desde a Idade Média se uniu em ligas, v.g. liga hanseática, contou com banqueiros tão importantes que chegaram a fazer eleger papas, foi com o tempo fazendo significativas descobertas no campo da física, da química, das ciências naturais, da filosofia e da música, e se preocupou com a instrução das populações.
Suponho que posso dizer que, no Portugal de tempos idos, a vida se tornou relativamente fácil para empresários e pessoal dirigente. Graças ao trabalho de escravos nas colónias ou de trabalhadores com salários baixos, conseguiam boas maquias na metrópole, com as quais iam vivendo. Tinham obrigatoriamente de estar de boas relações com o Estado e com a Igreja. Frases que ainda hoje se usam, como "O trabalho é bom para o preto", "trabalhar que nem um preto" e outras semelhantes entraram no vocabulário português e nele se mantiveram até hoje. Foram mantidas igualmente outras, como "trabalhar que nem um mouro", "ser um mouro de trabalho" e "julgas que eu sou um galego que faz tudo?", expressões que são resquícios da exploração do trabalho de populações muçulmanas e de galegos mais pobres que tentavam a sua chance em cidades maiores como Lisboa e Porto.
Estes conceitos não vêm a despropósito. Da mesma maneira que todo o homem se desenvolve com base numa infância e adolescência já passada, também os países têm estas suas idades que já foram engolidas pelo tempo mas que, no entanto, deixam sempre marcas que se mantêm até ao presente.
Quanto, durante a década de 90 do século passado, a União Europeia decidiu criar o euro – à semelhança do que os alemães tinham no final do século XIX feito com o seu marco -, o engenheiro Rogério Martins, que foi ministro após o 25 de Abril e sempre mostrou ser um bom conhecedor da história alemã, comentou num interessante artigo que não nos devíamos esquecer de que, para os germânicos, a substituição do marco pelo euro e a adesão de vários países a esta nova moeda, era "oiro". Expressando a sua ideia com graça, ele fez notar que, na pronúncia alemã, o –eu- se lê algo como –ói- , de onde a maneira alemã de pronunciar a nova moeda se assemelha de facto a "oiro". Foi uma observação perspicaz e certeira. Na realidade, pouco a pouco e apesar dos imensos dinheiros consumidos na restauração da reunificação com a República Democrática após a queda do Muro de Berlim, a Alemanha foi ganhando terreno através de trocas comerciais que lhe eram invariavelmente favoráveis e, graças a uma política de forte contenção salarial, conseguiu aumentar substancialmente a sua competitividade e surgir, após uma década, como o grande motor da União Europeia.
Falando do presente, verificamos que as exportações alemãs bateram no passado mês de Março todos os recordes com registo até agora (os registos existem desde 1950). Só no mês de Março, os alemães conseguiram exportador mercadorias e serviços no valor total de 98,3 biliões de euros. As importações também foram elevadas e atingiram igualmente um valor record, mas entre os 79,4 biliões de euros que as importações totalizaram e os 98,3 biliões das exportações ainda existe um saldo positivo praticamente da ordem dos 19 biliões de euros. Num mês. Nada de desprezar! Presentemente, a Alemanha é o segundo maior exportador mundial, logo a seguir à China. É opinião quase unânime que o país está a entrar numa década de ouro.
Com isto, acentua-se o facto de a Zona Euro estar a operar em duas velocidades. Enquanto a Alemanha e a França crescem, Portugal e a Grécia atravessam enormes dificuldades. E os juros dos empréstimos concedidos a estes dois países periféricos são altíssimos, mais para os atirarem para fora do euro do que para os manter no cabaz da moeda única. No fundo, os países de maior velocidade na Europa conhecem bem aquilo que é da sabedoria popular: maçãs podres num cesto de fruta tendem a fazer apodrecer toda a outra fruta do cesto. O remédio mais rápido e, certamente, mais eficaz, é o de nos livrarmos das maçãs que não estão sãs. Deixando a linguagem figurada: então, e se por acaso os países mais ricos tiverem interesses investidos nesses de economia mais fraca? Bem, se esse for o caso, ter-se-á então de arranjar maneira de garantir o seu pagamento. Emprestar dinheiro para que essa liquidação seja feita é uma das medidas possíveis. Quanto ao destino dos países sujeitos a este tratamento, isso é lá com eles! Se tivessem tido juízo e se tivessem comportado de outra maneira, não lhes teria sucedido o que sucedeu. Não nos recordamos todos da fábula do sapo que queria ser tão grande como o boi e tanto se encheu que rebentou? Porque é que uma história antiga não pode ser válida hoje em dia?
Para nós, portugueses, a situação não é nada brilhante. Embora tenhamos naturalmente que levantar cabeça e lutar, aquilo de que se falava há anos – "enquanto o alemão é arrogante, o português apresenta-se com ar rogante" – confirmou-se. Infelizmente. Na Alemanha existiu uma estratégia nacional de liderança. Os sindicatos cooperaram. A Alemanha ganhou uma nova consciência nacional. A competitividade que conseguiu nas suas exportações – muitas vezes para países da União Europeia – foi obtida graças a trabalho disciplinado, à mencionada contenção e ao fabrico dos componentes mais rudimentares para a sua indústria noutros países de salários mais baixos, reservando para o território alemão o fabrico dos componentes de tecnologia mais avançada. Com isso conseguiu preços concorrenciais e obteve o elevado montante de exportações atrás referido. Sem ser agora uma nação bélica – depois das experiências mal sucedidas da duas Grandes Guerras do século XX não se esperaria outra coisa -, a Alemanha não deixa de colaborar em todas as acções em que os Estados Unidos são a força predominante. Assim, enviou tropas suas para o Iraque, para o Afeganistão e outros países, à luz de tratados internacionais. Mas soube retirar a tempo as suas forças estacionadas na Líbia. Com isso, garante um posicionamento entre os primeiros lugares do comércio com os países em que as suas tropas operam. Através da sua política, a Alemanha tornou-se uma espécie de China de qualidade superior. As grandes somas de dinheiro que arrecada com as exportações são parcialmente investidas com bons juros noutros países da União Europeia, e não só.
Será bom lembrar aqui que a Alemanha foi, ainda no final do século XIX, o primeiro grande país a defender a política do Lebensraum, i.e. do espaço vital. De acordo com esse conceito, o espaço ocupado pela Alemanha na Europa seria demasiado reduzido para a capacidade e para o potencial alemães, de onde urgia que o país se expandisse e fosse ocupar outros territórios. O mundo só ganharia com isso. O seu grande problema foi que esses territórios já estavam ocupados pelas colónias europeias da Inglaterra, de Portugal, da França, da Espanha, da Bélgica e da Holanda. Para os conquistar, teria que delas desalojar os seus dominadores. Daqui resultaram, entre outros factores, as sucessivas acções bélicas que se traduziram em dois longos e mortíferos conflitos armados.
Eu diria que nas últimas décadas a política alemã tem sido bem diversa, mas não foge ao ambicioso conceito do Lebensraum. Tal como sucede com os chineses, o excesso de dinheiro do seu comércio tem sido usado para adquirir dívida soberana de alguns estados, de que se salientam Portugal, Grécia e Espanha.
E é aqui que eu entraria com a questão levantada pelo título deste post: quando o antigo colonizador passa a colonizado. Vou tentar ser claro. Uma das características principais do colonialismo, hoje aparentemente obsoleto, é a existência de comércio não-justo entre o país colonizador e a sua colónia. O país colonizador vende caro e compra barato. É uma situação que pessoalmente me lembra o que tive ocasião de presenciar em Angola em vários locais: fora das cidades, no chamado “mato”, cantinas (lojas) de brancos vendiam de tudo aos nativos a preços elevados e, no final do ano, se por acaso os nativos não tinham dinheiro para pagar a conta em dívida, os proprietários das lojas negociavam com os seus devedores o pagamento através de terras. Jomo Kenyatta (1894-1978), um esclarecido dirigente negro do Quénia, resumiu brilhantemente aquilo que, do seu ponto de vista, sucedeu com a colonização britânica: "Quando os brancos chegaram a África, nós tínhamos as terras e eles a Bíblia. Ensinaram-nos a rezar de olhos fechados. Quando os abrimos, eles tinham as terras e nós a Bíblia." Permito-me imaginar com que sentimento interior de revolta esta frase foi escrita.
Eventualmente mais importante ainda do que esta situação, porém, é o facto de as decisões de política comercial serem todas tomadas no país colonizador. Isto significa – ou significou, se se preferir – que, entre outras coisas, as eventuais plantações de açúcar, de algodão, de café, de cacau, etc. eram na sua generalidade feitas em proveito daquilo a que geralmente chamámos metrópole, que assim alimentava as suas fábricas de lanifícios, as suas refinarias de açúcar, as suas torrefacções de café, as suas fábricas de chocolate, etc. Daqui resulta que a colónia, por natureza não independente, tem – ou teve - de se submeter aos desígnios e interesses da metrópole.
No que toca à Alemanha, o país não viveu muito esta questão, embora tivesse tentado. E fá-lo-ia de forma bem mais insensível do que Portugal, a julgar pela sua experiência na Namíbia e pela sua tentativa de total aniquilação da população local. Ora, presentemente a Alemanha faz com Portugal e com a Grécia aquilo que um colonizador moderno faria, implacavelmente, com uma colónia, embora em moldes diferentes. O envio de uma comissão com poderes decisórios – a famosa troika – é bem reveladora do que digo. O documento assinado pelas autoridades portuguesas é de pura submissão. Por outro lado, a fixação de uma taxa de juro elevadíssima para o empréstimo denota exactamente o mesmo. A grande diferença é que agora não falamos de plantações, nem de explorações de petróleo ou de diamantes. Falamos de dinheiro. Vem a dar no mesmo. Infelizmente para todos, Portugal é forçado a beber do veneno que durante centenas de anos deu, talvez inconscientemente por parte de muitas pessoas, a beber aos povos que colonizou. São assim os altos e baixos da vida, na qual a única grande certeza é a de que nada se manterá eternamente igual: tudo, mais lentamente ou de forma mais rápida, acaba sempre por mudar.

5/07/2011

Uma história exemplar: o que pode resultar de uma dívida soberana





O último número da revista Time, datado de 9 de Maio, traz um artigo que considerei particularmente oportuno. Para informação dos leitores deste blogue, permiti-me traduzir livremente as partes que considerei mais significativas. É uma história sobre o Egipto. E não só. Poderia ser sobre a Itália. Sobre a Grécia. Sobre Portugal.

Mais ou menos há século e meio, o Egipto tinha-se transformado numa das modernas maravilhas do mundo. O facto de a Guerra Civil dos Estados Unidos ter arrasado a exportação de algodão do sul dos EUA fez com que os preços do algodão nos mercados mundiais aumentassem 8 (!) vezes, o que naturalmente encheu os bolsos dos plantadores de algodão do Egipto. O governante do país, Ismail Pasha, lançou-se com tal entusiasmo na construção de modernas linhas ferroviárias que o Egipto, país que na altura incluía o actual Sudão e algumas partes da Líbia e da Eritreia, orgulhava-se de possuir mais quilómetros de via férrea por hectare habitável do que qualquer outra nação do mundo. Isto em 1869.
Foi com enorme pompa que os egípcios celebraram a inauguração do Canal do Suez, uma maravilha da engenharia que permitia revolucionar várias rotas marítimas. Acorreram para assistir à inauguração altas personalidades de cidades como Londres e S. Petersburgo. Pretendiam ver com os seus próprios olhos um impressionante cortejo cerimonial de embarcações, com o iate imperial à frente, transportando a bordo a imperatriz francesa, Eugénia. As festividades prolongaram-se durante cerca de três semanas.
Porém, mesmo antes de a imperatriz francesa atravessar o Canal, os preços do algodão já tinham começado a descer devido ao final da Guerra Civil. A ostentação de Ismail Pasha só pôde continuar graças a vários empréstimos contraídos no estrangeiro. De 1867 ate 1875, a dívida soberana do Egipto saltou astronomicamente de 3 para 100 milhões de libras; entretanto, os preços do algodão continuaram a baixar, regressando aos níveis praticados antes do início da Guerra Civil americana. O Egipto deixou de ter qualquer possibilidade de pagar a sua dívida.
O que se seguiu constitui uma lição sobre a rapidez com que uma dívida pode comprometer a soberania de uma nação. Em 1875, o governante Ismail Pasha vendeu a posição do Egipto no Canal do Suez aos ingleses, que assim adquiriram mais uma jóia da coroa, tanto sob o ponto de vista financeiro como geopolítico, ao módico preço de 4 milhões de libras.
No ano seguinte, o Egipto não conseguiu pagar a sua dívida e, em 1878, viu-se forçado a aceitar um governo cuja função principal era a de satisfazer os seus credores estrangeiros. O próprio Ministro das Finanças era britânico. Em 1882 uma intervenção militar britânica ditou o destino do Egipto como colónia, que de facto passou a ser para todos os efeitos menos no nome.
Assim termina a primeira parte da lição que se pode colher do Suez. A segunda parte é mais subtil mas, para as grandes nações de hoje, mais desagradável de ouvir. Em meados do século XX, a Grã-Bretanha, a super-potência que se tinha aproveitado da crise da dívida soberana egípcia, estava ela própria a ser afectada por um mal semelhante. A razão mais evidente para as suas dificuldades financeiras residia numa série de empréstimos contraídos para enfrentar as despesas em que as duas guerras mundiais tinham feito o país incorrer. Embora os líderes britânicos acreditassem que continuavam a ser os grandes senhores do mundo, o seu poder era ilusório. Após o final da Segunda Grande Guerra, a Grã-Bretanha encontrava-se seriamente endividada perante os Estados Unidos. Quem se aproveitou deste facto foi o Presidente americano, Eisenhower, que, interessado em satisfazer Nasser, o novo líder do Egipto, e em evitar que ele passasse para o campo soviético, fez pressão política sobre a Grã-Bretanha, da qual conseguiu obter várias concessões, entre as quais a devolução do Canal ao Egipto.
A humilhação do Suez marcou o final das pretensões imperialistas da Grã-Bretanha. Segundo Niall Ferguson, um historiador muito em voga actualmente, foi no Banco de Inglaterra que o Império Britânico efectivamente soçobrou.

Quando a prata da casa inclui o ouro




Embora não seja muito elegante que nós citemos os nossos próprios textos, por vezes admito que isso vem mesmo a propósito. Em 6 de Março do ano passado, publiquei neste blogue um pequeno post ilustrado por um igualmente pequeno mapa. O título era Vêem-se gregos! E o que dizia o texto? Exactamente o seguinte:
"A mentalidade alemã entra definitivamente em choque com a prodigalidade nos gastos demonstrada pelos gregos. Os alemães vêem-se a si próprios como aforradores e não como gastadores. Daí negarem em absoluto o empréstimo de dinheiro dos contribuintes aos endividados gregos.
Dois deputados alemães sugeriram no Parlamento que a Grécia devia proceder à venda de ilhas desabitadas que possui para abater as suas dívidas. Esta sugestão pode arrepiar, mas está longe de ser original. Ao que me lembro, no virar do século XIX para o XX a Inglaterra também pretendia Angola em pagamento da dívida portuguesa. Noutro caso, as Filipinas passaram para as mãos dos americanos para que os espanhóis não lhes tivessem de pagar mais dinheiro como indemnização da guerra pela posse de Cuba na década de 1890.
Vender ilhas! Tudo me lembra uma ideia-base de castigo ao uso inconveniente pela Grécia do conceito Enjoy now, pay later!. Agora, tendo em consideração o seu enorme défice, dir-se-ia que a Grécia ouve alguém dizer: "Se queres ficar com a moto, tens que vender o sidecar!"
E quanto a Portugal? Deve começar a pôr as suas barbas de molho?"


Sabemos agora, em Maio de 2011, i. e. pouco mais de um ano após esta cena da tragédia grega, que deputados alemães da coligação de Ângela Merkel sugerem, no caso de Portugal, que o nosso país deve tratar de vender as suas reservas de ouro antes de pedir mais dinheiro emprestado a quem já tanto lhe emprestou. Ora, não só sucede que Portugal não possui ilhas desabitadas – as Selvagens valeriam muito pouco para qualquer comprador astuto, que sabe que o preço será fixado por si e não pelo vendedor – como se tornou um país famoso por acumular ouro durante a segunda guerra mundial. As reservas incluem algum ouro apreendido aos judeus pelos alemães no tempo de Hitler e entregue a Portugal pelos germânicos a troco de fornecimentos vários efectuados pelo governo português de então.
A Alemanha não brinca em serviço. Vendeu submarinos à Grécia, tal como vendeu submarinos a Portugal. Importantes empresas germânicas como a Siemens fizeram e fazem bons negócios no nosso país, enquanto numerosos bancos alemães emprestaram bom dinheiro à nossa banca, que estava ansiosa por realizar lucros garantidos com os portugueses, nomeadamente no campo da habitação/imobiliário.
Veja-se outro caso que ilustra bem como a Alemanha não faz política de ânimo leve: quando, há mais ou menos um ano, o Presidente alemão Horst Köhler ousou dizer que se havia tropas do seu país no Afeganistão era para favorecer a realização de contratos comerciais, aconteceu que mesmo ele, sendo um Presidente já no seu segundo mandato, não teve outro remédio senão apresentar a sua demissão. (“Um país com a nossa dimensão, que tem como base as suas exportações, tem de conscientemente entender que o envio de tropas para o estrangeiro é algo necessário” foi a frase que o condenou.)
Portugal tem jogado no amadorismo, esquecendo-se que do outro lado não tem já os territórios africanos do seu antigo Ultramar, mas sim, pelo contrário, profissionais europeus altamente competentes, que não só trabalham com rigor como obedecem a estratégias há muito montadas.
E quanto à nossa prata da casa? Será que é desta vez que vai, se não na totalidade pelo menos em grande parte? Teremos, em Maio de 2010, posto as nossas barbas de molho ou ficámos na mesma como se o assunto das ilhas gregas não tivesse qualquer relação com o nosso caso?
Conjuntamente com os finlandeses, o Parlamento alemão tem a última palavra. Será agora a nossa vez de nos vermos gregos?

5/02/2011

Poesia de A a Z

Para a letra D, Mário Dionísio:


É curioso
como as mãos se encarquilham
os dedos se deformam
os olhos menos brilham
mil rugas os contornam
os ombros se conformam
o ouvido endurece
o andar firmemente
se torna vagaroso
com seu quê de avantesma
o interesse esmorece
o que se ouve esquece
já tão pouco apetece
e o sorriso indiferente
irónico agradece
o "Mas tu estás na mesma"

Mário Dionísio, in "Terceira Idade"