4/11/2009

Vai passando a procissão



A época pascal é, decerto, aquele período do ano em que se realiza o maior número de procissões. A quadra natalícia também as tem, assim como a data em que se celebra o Corpo de Deus, mas é na Páscoa, com o registo da morte de Cristo e sua ressurreição que se realizam mais manifestações religiosas desta ordem. Procurei nos meus álbuns fotográficos a foto de uma procissão. Encontrei várias. As duas acima foram tiradas na mesma altura. O padre da paróquia, debaixo do pálio, segue, com as mãos em jeito de oração. Vai acolitado por um grupo de homens-bons. Logo atrás segue a banda filarmónica da terra e, imediatamente a seguir, vem a multidão que enche literalmente as ruas relativamente estreitas.
Alguns dos rostos da multidão que vemos na segunda foto lembram-me as feições das personagens delineadas e pintadas por Nuno Gonçalves no seu célebre políptico. As fotos foram tiradas poucos anos antes do 25 de Abril de 1974. Muitos dos que aqui estão, cristalizados naquele instante pela máquina fotográfica, já abandonaram o mundo dos vivos. É algo que não pode deixar de impressionar e trazer-nos à mente, se preciso fosse, a nossa iniludível efemeridade. Por outro lado, crianças que seguem ao colo das mães são hoje homens feitos que às suas mães possivelmente deram vários netos. As pessoas que acompanham e participam numa procissão estão simultaneamente a prestar uma homenagem religiosa e a procurar uma bênção para si próprias e para aqueles que levam consigo – um pouco como as raparigas solteiras que, numa boda de casamento, se encafuam debaixo do véu da noiva para que também elas tenham a sorte de se casar.
Por seu lado, a imprescindível banda de música repleta de reluzentes metais, instrumentos de sopro e de percussão, empresta um calor e uma solenidade especiais ao cortejo. Para as pessoas que se amontoam nas varandas decoradas com colchas vermelhas ou à janela das casas, a vibração causada pelos metais da banda impressiona poderosamente. Trombones, saxofones, trompas e fagotes ecoam contra as paredes das ruas da povoação por onde a procissão passa e as abençoa. Com cruzes, sacrários e imagens que saem excepcionalmente da igreja nessa ocasião, o cortejo acaba por se transformar numa missa itinerante celebrada ao ar livre. Tem o seu quê de operático.

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