6/29/2006

Matriz de Acontecimentos (29 Junho 2006)

A partir de hoje e até ao fim do Verão, o MNA Antiga está aberto, às quintas-feiras, até às 22h00.

Até 1 de Julho, Festival de Jazz de Torres Vedras.

Até 2 de Julho, na FIL, Feira Internacional de Artesanato, das 17h (13h ao Sáb. e Dom.) às 24h.

Quinta-feira, dia 29:

às 21h12, na Mezzo, documentário ?Felicity Lott et la Belle Hélène? (30 minutos, repete dia 30 às 14h10);

às 21h30, na Casa Fernando Pessoa (R. Coelho da Rocha, 16), debate ?Livros em Desassossego?;

às 23h30, no Catacumbas Bar (B.Alto, Trv. Água da Flor, 43), concerto da Nobody's Bizness, (?uma excelente banda de blues, com uma enorme vocalista portuguesa?).

Sexta-feira, dia 30:

às 23h00, no Maxime, Rao Kyao.

Sábado, dia 1:

às 15h00, no Edifício Sede da F. Gulbenkian, ?Alvarez no seu atelier!? visita-conversa por Ana Sá Fernandes;

às 22h30, na RTPN, António Cartaxo apresenta as ?Grandes Músicas? (30 minutos, repete, em princípio, domingo às 18h30, segunda-feira às 17h30, terça-feira às 02h30 e quinta-feira às 14h30);

às 22h30, na Esplanada da Cinemateca, "The Birds" de Alfred Hitchcock.

Domingo, dia 2

(não se efectiva o anunciado dia da Rússia, em São Carlos! Foi cancelado! Em troca, é dia Nacional do Vinho! Qual o espanto? Se a água tem um dia Internacional?):

às 12h00, no Edifício Sede da F. Gulbenkian, visita temática do ciclo ?Artistas da Colecção?: ?Do finito ao infinito da obra Começar de Almada Negreiros?, por Sílvia Almeida;

às 17h00, na Aula Magna, concerto de Jorge Moyano com a Orquestra Metropolitana de Lisboa (Mozart e Schumann).

às 22h00, junto à Torre de Belém, Cesária Évora.

Terça-feira, dia 4:

às 18h30, na Sociedade Portuguesa de Autores, " Armando José Fernandes? última conferência do ciclo "Compositores Fulcrais da Música Portuguesa do Século XX", por Alexandre Delgado;

às 23h15, na 2:, Ana Sousa Dias conversa com Gonçalo M. Tavares.

Quarta-feira, dia 5:

às 18h30, nos jardins da Fundação Oriente, Rua do Salitre, 66, segundo ?Concerto de Verão?: Elizabete Davis (percussão);

A seguir:

de 4 a 18 de Julho, 23º Festival de Teatro de Almada.

de 7 a 16 de Julho, XXV edição do Estoril Jazz.

de 17 e 27 de Julho, Cool Jazz Fest, em Cascais, Oeiras e Mafra.

12 de Novembro, Keith Jarrett no Centro Cultural de Belém

Download do ficheiro das Sugestôes (29 Junho 2006)

Bom fim de semana

JMiguel

6/28/2006

Portugal na elite futebolística

Para que não se diga que neste blogue não se escreve uma palavra sobre o Mundial de futebol, aqui vão umas breves palavrinhas. Agora que há apenas oito equipas com possibilidade de serem campeãs, verifica-se, sem surpresa, que seis são europeias e duas (Brasil e Argentina) de países que foram antigas colónias europeias e com os quais a Europa mantém estreitas relações. Como que a atestá-lo, a maioria dos componentes das selecções da Argentina e do Brasil alinham em equipas europeias. Neste ano de 2006, pode assim dizer-se que, no domínio futebolístico, a Europa tem dado cartas ao mundo. Da Ásia, de África, da Austrália e da América do Norte já não há uma única selecção a competir. Aliás, das oito equipas ainda em competição só duas não foram ainda campeãs mundiais: a novel Ucrânia e Portugal.
Portugal, vice-campeão europeu, tem-se mantido galhardamente entre os melhores. Terá feito um único jogo verdadeiramente bom: contra o Irão. No de abertura, fracote, chegou a ser dominado por Angola. Contra o México, começou muito bem, mas acabou por ganhar com dificuldade e ajuda do anjo da sorte. A disputa com a Holanda serviu para definir, por culpa de ambas as partes, a antítese do fair-play que se pretende. Faltas em cima de faltas amarelaram e avermelharam a partida. Felizmente para nós, o mesmo anjinho da guarda do jogo contra o México voltou a acompanhar a selecção portuguesa - sem dúvida bem coadjuvado pelo esforço denodado e porfiado dos nossos jogadores.
A religiosidade da nação voltou entretanto a vir ao de cima, à semelhança do que aconteceu aquando do Euro-2004. Muitas das bandeiras nas janelas lembram-nos colchas colocadas para saudar a passagem de uma virtual procissão. Por seu lado, os estandartes a tremular nos carros assemelham-se a velas desfraldadas de um barco. Na realidade, são outro tipo de velas: aquelas com que se alumiam santos. E correctamente, pois estamos na quadra deles: Santo António, S. João e S. Pedro. Que têm cumprido o seu dever.
Suceda o que suceder no próximo futuro, a honra do convento está salva. Todos apreciamos ver um inegável espírito de equipa na selecção nacional portuguesa. E é muito bom que já tenham sido proporcionados múltiplos dias de euforia não só ao povo residente no território nacional, como a milhares de emigrantes portugueses em variadíssimas partes do mundo.

6/25/2006

O Sexo dos Anjos


Há muito que penso que este seria um esplêndido nome para uma casa comercial de artigos eróticos situada no Bairro dos Anjos. Talvez o pároco local se erguesse contra a designação, porque isto de misturar erotismo com símbolos eclesiásticos nem sempre é visto com o necessário sentido de humor, mas enfim...
Esta conversa vem, afinal, a propósito de uma singela ida à padaria hoje de manhã. Nalgumas padarias vende-se pão de vários tipos com nomes que nos são familiares: há avós, que são mais cheiinhas, há avôs, invariavelmente mais chatos, há netas e há igualmente netos, que são mais pequenos. De filhos nada me consta, a não ser os filhos-da-mãe dos padeiros que, a coberto da noite, por vezes abastardam as farinhas e baralham tudo. Mas deixemo-nos destas considerações inoportunas e vamos ao que interessa. Apontando para um cesto, perguntei à bem-humorada senhora que me estava a atender: "São netos ou netas?" "Nem eu sei," disse-me ela. "Creio que estes são como os anjos. Não têm sexo."
Está bem de ver que, a juntar às netas-ou-netos, consegui trazer um pouco de boa-disposição. O que me fez voar até ao Brasil em pensamento. O Brasil é, como todos sabemos, um país muitíssimo especial. Toda a pujança daquela natureza extraordinária é uma emanação directa de Deus. Talvez por isso os brasileiros digam que Deus demorou dois dias da semana a fazer o mundo e os restantes cinco a alindar o Brasil. Talvez por isso também, eles digam, com toda a crença e fervor, que Deus é brasileiro.
E os anjos? Bem, os anjos são igualmente muito especiais. Ao ver-se na quentura daquele Brasil tão inflamante dos sentidos, a arte barroca dos portugueses não resistiu ao assexuado dos anjos. Seria um crime! A foto que ilustra este post foi tirada por mim numa modesta mas simpatiquíssima pensão situada na praça principal de Ouro Preto, em Minas Gerais. Ver aquele anjinho, decerto retirado de uma capela em decadência mas agora impecavelmente restaurado, num nicho da escada que conduzia à recepção, fez-me naturalmente soltar uma valente gargalhada. Quem disse que os anjos não têm sexo?

6/22/2006

Ordem + Contra-ordem = Desordem

Há uns meses, alguém me chamou a atenção para um acto da Autoridade da Concorrência, liderada por Abel Mateus. Tratava-se de multas pesadas infligidas a multinacionais do sector farmacêutico por comprovada formação ilegal de cartéis. "Até que enfim que aparece alguém a pôr mão nisto! A ver se o regabofe pára!"
A Autoridade da Concorrência foi bem recebida por muitos cidadãos porque viram nela a defesa dos seus interesses. Constataram a existência de equipas de investigação que apuravam a legalidade ou a ilicitude dos actos efectuados por grandes empresas, as quais tendem a não praticar a livre concorrência e a ficar impunes no nosso país.
Abel Mateus tem-se mostrado competente, firme e discreto. Nas entrevistas que lhe solicitaram, não alardeou nenhum desejo de celebridade.
Há umas semanas, o governo de Sócrates fez o impensável: desautorizou a Autoridade. O ministro da Economia foi contra o parecer prévio da Autoridade da Concorrência, ao permitir que a Brisa, empresa de auto-estradas, adquirisse uma percentagem significativa das acções da Auto-Estradas Atlântico. A tendência óbvia para uma situação de monopólio terá levado a Autoridade a opor-se. Pois o ministro da Economia, e com ele o Primeiro-Ministro, acharam que não e foi a opinião deles que prevaleceu.
Assim não se vai a lado nenhum. É presumível que, num assunto desta ordem, Abel Mateus - com uma vasta experiência no Banco de Portugal - tivesse informado o governo da sua decisão antes de fazer o anúncio aos media. O governo terá aprovado, tacitamente ou não, a decisão da Autoridade. Que, posteriormente, tenha sido um membro do governo a decidir o contrário é absolutamente inadmissível. Como se pretende dar credibilidade às instituições se depois se lhes retira o tapete?
O mais grave de toda esta questão reside na omnipresença e interferência do governo. Deste e de outros que o precederam, evidentemente. É por estas e por outras que, por exemplo, o parlamento português é mais uma correia de transmissão dos partidos, incluindo obviamente o governamental, que uma Assembleia verdadeiramente independente composta por deputados que ousam exprimir as suas próprias opiniões. O desrespeito contínuo pela autonomia dos outros acaba por desresponsabilizar esses outros. Lá se vai a responsabilização de que tanto se fala.
É curioso que o Presidente da República não se tenha ainda referido ao assunto. O facto, aqui várias vezes mencionado, que "o precedente é por vezes mais importante que o presidente" torna-se cada vez mais válido. Em vista da desautorização feita pelo governo, poderá estranhar-se que, num gesto perfeitamente inédito, as ordens profissionais do sector da saúde, através dos seus líderes, se tenham unido recentemente na sua luta contra a Autoridade da Concorrência? Conhecendo o precedente, se a Autoridade não ceder, as ordens já sabem onde hão-de ir pedir batatinhas!

6/19/2006

Três itens linguísticos em análise

O que brevemente me proponho descrever tem muito pouco de científico. Sou o primeiro a admiti-lo. Contudo, partindo do princípio de que uma língua não é pertença de ninguém senão da comunidade dos seus falantes e passa muito para além da mera etimologia, gostaria de falar sobre duas palavras que me parecem menos certas - embora, evidentemente, estejam correctas na medida em que são aprovadas pela comunidade falante - e sobre um caso referente a adjectivos.
Uma palavra portuguesa que me parece errónea, pela natureza da única vogal que possui, é "luz". Sei bem que em latim é luce-, que em castelhano é luz, que em francês é lumière, o que já está melhor, e em alemão Licht. Quando Goethe diz, ao morrer, Mehr Licht!, ele está a clamar por "mais luz", o que se entende na óptica da razão. Falta, porém, à palavra a sonoridade do sol, que é a expressão mais natural da luz. É aqui que acho que "luz" falha. O -u- que fica encaixado entre o l- e o -z representa tudo menos claridade. O adjectivo "claro", com o seu -a- aberto, tem claridade dentro de si, mas "luz" não tem. Comparem-se outras palavras como escuro, obscuro, soturno, nocturno, túmulo, lúgubre, fúnebre, todas com peso fonético no -u-. São palavras de fundo e não de topo, de escuro e não de claro.
É em inglês que encontro uma reprodução melhor. Light, na sua pronúncia moderna, porque antigamente lembrava o alemão Licht, abre-nos os ouvidos para algo não escuro, acorda-nos os sentidos para luminosidade, palavra que, tal como o francês lumière, sai do -u- para a claridade.
Entretanto, não se infira daqui que estarei a dizer que o inglês supera o português. Veja-se a palavra "sol", que em inglês é um pardacento sun e na nossa língua resplandece com o seu -o- muito aberto. Já algum português imaginou dizer "sol" com um -ô- fechado, como se o sol estivesse sempre tapado pelas nuvens?!
Uma segunda palavra que me levanta objecções é "solidariedade". Algo particularmente bonito como atitude, é léxico que estranho pela forma como começa. Dir-me-ão que a palavra tem a ver com algo sólido, como amizade, amor, afecto. Deve ser. Mas o que sinto faltar em "solidariedade" é um pequeno prefixo no início. A solidariedade nunca é um acto solitário, para connosco próprios. Mas, como vocábulo, parece um pouco isso. De facto, um grande número de palavras que expressivamente envolvem outros, como compaixão, consolação, comunicação, combinação, compatibilidade, concordância, concorrência, condescendência, possuem o prefixo com- (por vezes grafado con-). Vão dizer-me que "consolidariedade" seria vocábulo demasiado longo. E difícil de dizer. Admito. Mas mais expressivo, também. Como está, fica demasiado perto de "solitariedade", que nada tem a ver com uma acção que envolve outros, o que constitui o cerne da solidariedade.
Um terceiro considerando, discutível como os dois anteriores, remete-nos para algo diferente, mas que tem igualmente a ver com sonoridade linguística. Tomemos três adjectivos: gracioso, delicioso e manhoso. Como é normal na língua portuguesa, estes adjectivos formam o seu feminino em -a, transformando-se, respectivamente, em graciosa, deliciosa e manhosa. Ora, no feminino, a sonoridade destes adjectivos muda radicalmente: o -o- que é fechado no masculino, pronunciado -ô- (devido à influência do -o final que se pronuncia -u, o que faz fechar o som) transforma-se em -ó- aberto. Daqui deriva, em meu entender, um halo bem diferente para o adjectivo. "Delicioso" assume uma posição neutra entre masculino e feminino. Entre "uma sopa deliciosa" e "um pudim delicioso", venha um santo amante da boa mesa e escolha. Já "graciosa", com o seu -ó- aberto, soa de forma muito mais bonita e expressiva no feminino do que "gracioso". Pelo contrário, em "manhoso", devido à conotação da palavra, o -ô- fechado do masculino funciona muito melhor. É ele que contém a manha toda. Et pourtant...

6/17/2006

Anões sobre os ombros de gigantes

Quando há duas semanas ou três o tempo esteve quente e o sol brilhou, a praia apeteceu a muita gente. Num desses fins-de-semana encontrei o Miguel, um amigo do meu filho, a passear na praia com o seu rapaz de dois anos às cavalitas. Ele é bastante alto, e o filho obviamente pequeno. Mas, lá das alturas, o miúdo topava tudo. Não me contive e atirei-lhe: "Um anão aos ombros de um gigante vê mais do que o gigante." O Miguel não conhecia a frase e perguntou-me se eu acabava de a inventar. Lá lhe expliquei rapidamente que não - o sol abrasava e não dava para longas conversas -, mas que havia muito de verdade naquelas palavras. Concordou. Que nunca tinha pensado nisso.
Nada de mais natural, de facto. A frase é de Bernardo de Chartres, brilhante homem da Igreja que viveu há oitocentos anos. O que ele escreveu é um pouco mais longo: "Somos anões aos ombros de gigantes. Vemos mais do que eles e temos horizontes mais vastos, não em virtude de melhor vista da nossa parte ou de outro dom físico especial, mas sim porque somos elevados e transportados no alto devido ao tamanho dos gigantes."
É toda uma definição de cultura que está aqui sintetizada. Cultura como legado dos nossos antepassados e também de pessoas nossas contemporâneas. Educação através de livros, relatos de experiências, filmes, viagens, contactos com indivíduos que sabem mais do que nós e nos dão o seu apport. Com isso, podemos ver melhor e mais longe, ter uma visão de conjunto mais abrangente e correcta. Utilizamos a sabedoria acumulada de muitos outros que nos precederam e de quem somos largamente devedores. Por vezes ingratos, porque nem lhes citamos os nomes, mesmo conhecendo-os.
É claro que ninguém é capaz de abraçar e digerir nem uma parte substancial de toda a sabedoria acumulada. Temos um tempo limitado de vida. Do nosso lado, porém, devemos procurar elevar-nos e elevar os outros tão alto quanto pudermos. Daí o tentarmos dar boa educação aos nossos filhos, aprendermos com amigos e com eles partilhar o pouco que sabemos. Daí, se professores, esforçarmo-nos por aprender mais para melhor comunicarmos e deixarmos sementes a germinar.
Se podemos ser como anões aos ombros de gigantes é bom que o tentemos. A ignorância é não só um dos cancros da sociedade como uma enorme injustiça para com o passado e, certamente, para com todos aqueles que no presente insistem em colocar-se lá nas alturas.

6/09/2006

Nomes próprios

Meti-me no outro dia numa curta mas interessante aventura à busca da origem de nomes próprios. É claro que hoje em dia quando usamos um nome raramente pensamos no seu significado original. Um João Miguel é um João Miguel e chega. Tem é de ser um bom tipo. Porque isso de saber qual a origem de um nome nada tem a ver, geralmente, com a pessoa que ostenta esse nome no B.I. Por este motivo tão simples, transforma-se em puro diletantismo, ficção se lhe quisermos chamar, procurar a origem dos nomes. Mas como existem surpresas, o que é sempre apelativo num mundo que tem muito de déjà vu, aqui partilho convosco umas breves linhas sobre o assunto. Se pretenderem mais, é só pedir - mas por mail.
É curioso verificar, por exemplo, que se o nome Hilário significa alegre e feliz, passamos a entender melhor a razão por que dizemos hilariante. Se Verna, nome feminino, significa primaveril, entendemos igualmente melhor como, com a junção do prefixo in-, ela se torna no seu oposto invernoso em termos de estação do ano.
No que diz respeito aos nomes que normalmente usamos, as suas origens são geralmente hebraicas ou gregas, latinas ou germânicas.
Muitos dos nomes germânicos falam-nos de combates e batalhas. Assim, o Herman é um homem do exército, o Lancelote é guerreiro, o Walter é general, o Adolfo é um nobre lobo, enquanto o Hildebrando é uma espada de guerra. E não se julgue que as Brunhildas, donzelas morenas de armas, as Gunhildes bravas lutadoras ou as Matildes fortes nas batalhas escapam a esta linha. A Carolina é uma variante de Carla, que por sua vez é viril. Entretanto, o Fernando é audaz mas pacífico.
Já os gregos e latinos emprestam sabores e odores mediterrânicos a muitos dos seus nomes e conotam-nos com os dons dos deuses. A Laura é latina e está obviamente ligada ao loureiro, em si uma árvore que simboliza o triunfo. A Melinda sabe a mel. Tanto a Lúcia, como a Lucília ou ainda a Lucinda são brilhantes como a luz. A Inês é simplesmente donzela e a Letícia é alegria. A Liliana evoca o lírio, símbolo de pureza. A Nídia é uma avezinha ainda no seu ninho. O Alexandre ajuda os homens, enquanto o António floresce e prospera.
Os hebreus tiveram uma fixação no seu Deus. O seu. Consideraram-se e consideram-se os eleitos. O sufixo -el, associado a Deus, termina imensos nomes hebraicos, como Israel, Ezequiel, Rafael, Gabriel, Emanuel, Manuel, Samuel. Por aqui vemos que o Miguel é divino: "quem é assim para com o Senhor?" Por seu lado, toda a Ana (Hannah em hebraico) é graça, não só de graciosa mas de ter recebido graças. A graça das Anas é bem conhecida. Curiosamente, o João afirma no seu nome que o Senhor é cheio de graças.
De entre os nomes mais fecundos tem de salientar-se o de Elisabete. É cepa comum para vários cachos, como as Elisas e as Isabéis. Mas também aí entroncam a Lisa, a Lisete e Lizota. E a Beta. Outro nome feminino fecundo é o de Margarida, que originalmente significa pérola. Das Margueritas mexicanas passamos às Margots inglesas, que desaguam nas Ritas.
E, depois, há aquelas confusões engraçadas, que são as voltas que o mundo dá. O Iago original é Jacó, também escrito Jacob. Como foi santo ibérico, aqui transformou-se em Santiago. Por ser assim, em Compostela festejamos o santo mas temos o ano jacobéu. Contudo, em França os Jacobs são Jacques. Daí termos os jacobinos. Daqui resulta também que Jacqueline é apenas uma forma francesa de jacobina. Entretanto, os ingleses não ficaram atrás e criaram a sua forma própria de Jacob: James. Daqui advém que uma jacobina inglesa é uma Jamesina. Neste nosso Portugal, um Jacó é um papagaio de nariz adunco de judeu.
A Ariadne, para além de criativa na concepção da forma como Teseu sairia do labirinto após matar o Minotauro, é afinal também uma Bartoli. O significado original grego é o de doce cantora. Doce é também o que encontramos num nome latino como o de Dulce e num grego como o de Melissa.
E terminemos por aqui, não apareça por aí algum crítico Marcelo, que a etimologia associa a Marte, deus e planeta da guerra, o que lhe dá necessários contornos bélicos e aguerridos.

6/06/2006

Conteúdo e Forma

Hoje não venho com politiquices. Primeiro ainda pensei em trazer para aqui em detalhe aquele badalado caso de os automóveis governamentais não serem autuados por excesso de velocidade tanto nas estradas como a atravessar povoações. Um caso, afinal, que lembra duas coisas: o filme de James Bond Order to Kill e, ainda mais ominosamente, aquele país tão bem retratado pelo George Orwell no seu Animal Farm. Infelizmente, esse país era tudo menos uma democracia...
Mas deixemo-nos dessas coisas. Foi apenas um parágrafo escrito em velocidade excessiva para preencher espaço. Porque aquilo que verdadeiramente quero fazer aqui é citar uma frasesinha que hoje encontrei, ao folhear um romance bem conhecido de um nosso não menos conhecido escritor. Ei-la: "O português nunca pode ser homem de ideias, por causa da paixão da forma. A sua mania é fazer belas frases, ver-lhes o brilho, sentir-lhes a música. Se for necessário saltear a ideia, deixá-la incompleta, exagerá-la, para a frase ganhar em beleza, o desgraçado não hesita... Vá-se pela água abaixo o pensamento, mas salve-se a bela frase."

6/05/2006

Alvo errado

Gostaria de não ter que voltar ao assunto, até porque há muito mais mundo no mundo. Todavia, o barulho à volta da questão da avaliação dos professores pelos pais dos alunos é ensurdecedor. Tendo levantado aqui o tema da avaliação há um mês, gostaria de não ter que me centrar na justiça ou não daquele tipo de avaliação, da qual entretanto já afirmei discordar. No entanto, isso não quer dizer que discorde da avaliação dos professores em si ou da intervenção dos pais na escola. Quem apresenta uma proposta para discussão traz invariavelmente na manga uns tantos itens para entregar aos adversários; neste caso, creio que a avaliação dos docentes pelos pais será um deles. Quanto mais se falar dele, mais ele se vai valorizando, o que será óptimo para os negociadores proponentes porque se trata de um item descartável. Entretanto, os outros pontos vão ficando mais esquecidos. Ora, os outros, como o número de lugares de professor titular por escola e as percentagens máximas de atribuição de excelente e muito bom são bem mais importantes e, em princípio, inegociáveis.
O problema à volta da educação, relativamente à qual a maioria das pessoas sente que há muita coisa que não bate certo, teve iniludivelmente a sua origem num local: os gabinetes do Ministério. Foram mais uma vez os demagogos, a nadar em fundos vindos do estrangeiro e com ideias facilitistas num assunto tão sério, que deram cabo do rigor que é devido na educação e criaram um monstrozinho constantemente a necessitar de mais um remendo aqui e outro ali. O aborto que daqui resultou fica a milhas de distância, em termos de objectivos palpáveis, do dinheiro que custou aos nossos parceiros comunitários e aos portugueses.
Na senda do novo Papa, que, sendo embora alemão, teve o desplante de recentemente isentar o povo alemão da culpa do que sucedeu em Auschwitz e noutros campos de concentração, questionando o próprio Deus pelo porquê da sua não-intervenção, aqui também o Ministério faz algo que brada aos céus: sem fazer um acto de contrição, carrega inexoravelmente sobre os professores. E estes não têm culpa? Sobre isto já respondi noutro post.
Existe contudo uma noção de prioridades em que a actual ministra, de quem no geral até gosto, me parece ter errado. Porque é que não começou por onde devia ter começado, pela re-introdução das avaliações dos alunos através de exames de fim-de-ciclo? A simples existência desses exames nacionais, no final do 1º ciclo, 2º e 3º acabaria por proporcionar o sumo da avaliação pretendida aos professores. Mais: acabaria por levar toda a gente a trabalhar mais e a ter mais rigor. A sociedade, no geral, precisa de mais trabalho e de maior seriedade. Contra esta medida levantar-se-iam, naturalmente, todos os que não gostam de ser avaliados e que detestam quantificações. Também todos os pais que almejam um canudo para os filhos tão depressa quanto possível. O problema é que é disto que o país precisa: de pessoas bem preparadas, que encarem o trabalho como algo gratificante e compensatório - não como um fardo.
Se a prioridade for alterada e os exames à escala nacional forem para a frente, muita coisa se alterará. Haverá grandes desapontamentos, bem entendido, mas será reposta uma verdade maior. Em simultâneo com isso virá necessariamente a reposição da disciplina nas escolas, absolutamente essencial, e uma renovada respeitabilidade do status do professor, algo que as medidas tomadas ao longo de décadas têm arrasado, com prejuízo para todos e sem vantagens notórias para ninguém.