6/05/2006

Alvo errado

Gostaria de não ter que voltar ao assunto, até porque há muito mais mundo no mundo. Todavia, o barulho à volta da questão da avaliação dos professores pelos pais dos alunos é ensurdecedor. Tendo levantado aqui o tema da avaliação há um mês, gostaria de não ter que me centrar na justiça ou não daquele tipo de avaliação, da qual entretanto já afirmei discordar. No entanto, isso não quer dizer que discorde da avaliação dos professores em si ou da intervenção dos pais na escola. Quem apresenta uma proposta para discussão traz invariavelmente na manga uns tantos itens para entregar aos adversários; neste caso, creio que a avaliação dos docentes pelos pais será um deles. Quanto mais se falar dele, mais ele se vai valorizando, o que será óptimo para os negociadores proponentes porque se trata de um item descartável. Entretanto, os outros pontos vão ficando mais esquecidos. Ora, os outros, como o número de lugares de professor titular por escola e as percentagens máximas de atribuição de excelente e muito bom são bem mais importantes e, em princípio, inegociáveis.
O problema à volta da educação, relativamente à qual a maioria das pessoas sente que há muita coisa que não bate certo, teve iniludivelmente a sua origem num local: os gabinetes do Ministério. Foram mais uma vez os demagogos, a nadar em fundos vindos do estrangeiro e com ideias facilitistas num assunto tão sério, que deram cabo do rigor que é devido na educação e criaram um monstrozinho constantemente a necessitar de mais um remendo aqui e outro ali. O aborto que daqui resultou fica a milhas de distância, em termos de objectivos palpáveis, do dinheiro que custou aos nossos parceiros comunitários e aos portugueses.
Na senda do novo Papa, que, sendo embora alemão, teve o desplante de recentemente isentar o povo alemão da culpa do que sucedeu em Auschwitz e noutros campos de concentração, questionando o próprio Deus pelo porquê da sua não-intervenção, aqui também o Ministério faz algo que brada aos céus: sem fazer um acto de contrição, carrega inexoravelmente sobre os professores. E estes não têm culpa? Sobre isto já respondi noutro post.
Existe contudo uma noção de prioridades em que a actual ministra, de quem no geral até gosto, me parece ter errado. Porque é que não começou por onde devia ter começado, pela re-introdução das avaliações dos alunos através de exames de fim-de-ciclo? A simples existência desses exames nacionais, no final do 1º ciclo, 2º e 3º acabaria por proporcionar o sumo da avaliação pretendida aos professores. Mais: acabaria por levar toda a gente a trabalhar mais e a ter mais rigor. A sociedade, no geral, precisa de mais trabalho e de maior seriedade. Contra esta medida levantar-se-iam, naturalmente, todos os que não gostam de ser avaliados e que detestam quantificações. Também todos os pais que almejam um canudo para os filhos tão depressa quanto possível. O problema é que é disto que o país precisa: de pessoas bem preparadas, que encarem o trabalho como algo gratificante e compensatório - não como um fardo.
Se a prioridade for alterada e os exames à escala nacional forem para a frente, muita coisa se alterará. Haverá grandes desapontamentos, bem entendido, mas será reposta uma verdade maior. Em simultâneo com isso virá necessariamente a reposição da disciplina nas escolas, absolutamente essencial, e uma renovada respeitabilidade do status do professor, algo que as medidas tomadas ao longo de décadas têm arrasado, com prejuízo para todos e sem vantagens notórias para ninguém.

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