7/24/2007

Autenticidade encenada

A propósito do título acima, ocorre-me um almoço dominical na casa dos meus pais, tinha eu apenas sete ou oito anos. Estávamos à mesa todos os membros da família e mais um casal amigo, o que representava um total de dezoito pessoas (este era sempre o número limite por causa da mesa e da sala). Não me lembrando já dos antecedentes, recordo que a certa altura a conversa entre os adultos incluiu a menção de um beijo. Do meu lugar eu terei metido o bedelho na conversa, o que fez com que os outros me perguntassem se eu sabia o que era beijar. Respondi-lhes que sim. Aí, todos fingiram não saber. Pediram-me então que lhes explicasse e, candidamente, dei-lhes uma explicação. Descrevi-lhes um beijo "à cinéfila". Alguém comentou: "Mas isso é só nos filmes". Todos imediatamente concordaram.
Só anos mais tarde é que vi o ridículo da situação. Eles tinham fingido bem, reagindo com acerto e humor à minha ingenuidade. Tratava-se de uma reacção concertada no momento.
Ora, uma reacção é muito diferente de uma acção. Esta corresponde a uma iniciativa tomada por alguém. Há dias, tivemos um caso típico de autenticidade encenada, na circunstância pelo partido socialista. À boa maneira do eterno caciquismo, o partido arrebanhou gentes de Cabeceiras de Basto e do Alandroal para celebrar com um banho de multidão um pouco maior a prevista vitória de António. Costa nas eleições para a Câmara de Lisboa. A população de Lisboa soube do caso e, naturalmente, não gostou. Ninguém gosta de comer gato por lebre.
Eis que os spin doctors socialistas atacam de novo. Dentro da admissível auto-promoção da "revolução tecnológica" que o governo tem apregoado, os assessores de imagem congeminaram a cena de uma sala de aula com miúdos recrutados por uma empresa de casting, a qual lhes pagou a 30 euros por cabeça para serem figurantes. No fundo, a presença da ministra da Educação e do primeiro-ministro acabou por servir para realçar a falsa autenticidade da encenação. E com crianças, senhores?
Houve, no entanto, um aspecto muito positivo que convém igualmente salientar: a televisão pública mostrou as imagens, como se esperaria, mas revelou também as perguntas feitas pelos jornalistas e as esclarecedoras respostas dos miúdos, o que constituiu um bom exemplo de liberdade de trabalho da RTP, contra aqueles que falam em governamentalização total. Valha-nos isso!

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