9/07/2010

Viva a República!


Fui no domingo pela segunda vez visitar a exposição sobre a República no edifício da Cordoaria. Desta vez fui mais para tirar umas tantas fotografias, mas aproveitei para re-saborear os títulos, os textos, os filmes, e outros documentos que lá estão sobre a atribulada vida da 1ª República portuguesa, com os seus antecedentes e os numerosos eventos que lhe sobrevieram.
Possivelmente o que mais me impressionou foi a enorme paixão, testemunhada pelos vibrantes discursos, as manifestações, os frequentes combates armados, os inflamados artigos de opinião em jornais e revistas que transparecem de uma exposição que, apesar de longa, merece em minha opinião ser visitada.
E o que ficou daqueles tempos? Ali vemos pessoas, mais homens do que mulheres, deparamos com os seus rostos, cremos adivinhar-lhes o que lhes vai na alma. Dos republicanos iniciais ressalta um enorme sonho de sociedade nova, que depois não se materializou senão em parte e redundou numa certa desilusão para o povo, que sofria e continuou a sofrer fortes privações. Dos monárquicos veio a esperada reacção, assim como da Igreja Católica. Muita gente empenhada em procurar o melhor. A 1ª Grande Guerra de permeio não ajudou em nada a reconstruir o país. Terá no entanto contribuído para a manutenção do império colonial.
E o que ficou daquelas pessoas? De muitas delas, eu diria que só o nome. Para muita gente que hoje habita em Lisboa, cidade onde a revolução republicana eclodiu, quem foi o indivíduo a quem foi dado o nome da Avenida Almirante Reis? Que fez ele de importante para destronar o nome anterior dessa artéria, que era o da Rainha D. Amélia? E o Afonso Costa, estava do lado dos monárquicos ou dos republicanos? E o Pimenta de Castro? E o Álvaro de Castro? E o General Sousa Dias? E quem foi o Buíças? Pessoas que no seu tempo foram famosas e que provocaram acesas discussões surgem hoje como nomes de ruas, mais do que qualquer outra coisa - salvo para os historiadores e estudiosos daquele período, como é evidente. Ao ver algo que foi relativamente recente e ao chegarmos a esta conclusão, ocorre-nos a evidência de que o presente cedo se torna passado, que a efemeridade da vida é mesmo um facto, que o hoje será daqui a algum tempo como que antiguidade. Sempre é uma lição. Mas se me perguntarem se mesmo assim vale a pena, responderei, como o poeta, que tudo vale a pena (quando a alma não é pequena. E alguns daqueles homens tinham uma alma grande).
A quem lá dê um salto, uma pequena indicação: na última sala, existe uma porta que nem parece porta, que dá para um espaço onde são exibidos vários documentários sobre a República, hoje à guarda da Cinemateca Nacional. Empurrar levemente a porta leva-nos a umas cadeiras razoavelmente confortáveis e a um écran onde esses documentários são exibidos. O total de filmes perfaz mais de três horas, pelo que se desaconselha ao comum dos mortais receber essa verdadeira overdose, mas é um facto que existem partes bem interessantes. Talvez esteja a passar alguma destas quando se franqueia a porta…

P.i.S.s. – Os sanitários da Cordoaria ficam numa fila de dois blocos num pátio do edifício. Num dos espaços para homens que utilizei, deparei, para além da habitual sanita e um autoclismo, com dois espelhos algo estranhamente colocados. Um está numa parede ao lado da sanita, a baixa altura, conveniente para quem está sentado se poder olhar. O outro está por cima do autoclismo, o que permite ao utilizador auto-ver-se reflectido durante o acto de urinar. Original, pelo menos. Os homens com bom sentido de humor já há muito que inventaram para os mais idosos com uma barriga bem protuberante a possibilidade de entrever o seu membro outrora procriador através de um instrumento a que deram o bem-humorado nome de "peniscópio". Funcionaria como o periscópio dos submarinos, mas de cima para baixo. Aqui neste caso da Cordoaria, o peniscópio não é necessário. O espelhinho resolve a situação. Inédito, para mim pelo menos. Viva a República!

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