11/09/2010

Schadenfreude e Fair-Play

Que me perdoe a Isabel, que não gosta de futebol, mas vou voltar ao tema num post que não vai ser longo. Presentemente, os famosos três FFs, (Fado, Fátima e Futebol) tão criticados no regime salazarista, não só se mantêm como se têm acentuado. No que ao futebol diz respeito, as transmissões televisivas fizeram aumentar a exposição das pessoas ao desporto-espectáculo na sua própria casa. De sexta-feira à noite até segunda-feira igualmente à noite, há jogos do campeonato principal português. E quem não gosta do futebol nacional, passa para o estrangeiro, onde estão os melhores jogadores (entre os quais muitos portugueses).
Ora, no passado fim-de-semana futebolístico havia um jogo-grande ao domingo e um outro, menor mas também importante, na segunda-feira. A rivalidade entre o Norte e o Sul acendeu-se com o combate dos dois chefes: o campeão habitual, que é o FC Porto, e o campeão actual, que é o Benfica. Um jogo desta ordem é sempre um tira-teimas para ver quem é o melhor. As duas cidades maiores do país estão em compita também: Lisboa versus Porto. Os resultados costumam ser equilibrados. Neste domingo, contudo, não houve qualquer equilíbrio. Sem apelo nem agravo, os do Porto infligiram cinco golos aos benfiquistas, que ficaram a zero.
É aqui que vem a Schadenfreude, uma daquelas poucas palavras alemãs que passaram para o vocabulário internacional. Schadenfreude significa o regozijo que alguém sente perante o desaire de um rival ou inimigo. Os sportinguistas embandeiraram em arco e na segunda-feira de manhã cumprimentaram os seus colegas benfiquistas com o habitual aperto-de-mão, desta vez maldosamente enfeitado com as palavras “Mais cinco!” e um risinho malandro ao estilo do Muttley.
À noite o Sporting jogava para chegar ao segundo lugar. Contra uma equipa do Norte, i.e. tratava-se de mais um Norte-Sul. Jogado em casa do Sporting. Os adeptos sportinguistas vibraram com o seu primeiro golo, que suscitou algumas dúvidas perante a possibilidade de partir de um fora-de-jogo. Foi dado o benefício da dúvida ao atacante. O Sporting até jogava bem. A outra equipa, vimaranense, parecia algo desnorteada. E mais desnorteada decerto ficou quando surgiu o segundo golo do Sporting, conseguido através de um canto directo que, porém, não fez a bola entrar na baliza. Foi um falso golo. Mas como o árbitro o validou, passou a contar. Os vimaranenses protestaram com razão e levaram cartões amarelos.
Descansaram os sportinguistas na segunda parte. Eis senão quando entra um novo jogador para os nortenhos. A equipa visitante empertiga-se. Estão motivados para pelo menos vingar a injustiça daquele falso golo. Há entretanto um jogador sportinguista que pontapeia um adversário e é justamente expulso. De súbito, não só há alma nova na equipa visitante como o desnorte acaba por atacar a equipa do Sul que, por sua própria culpa, joga apenas com dez. E, num curtíssimo espaço de tempo, os visitantes marcam três golos. Vencem a partida.
A Schadenfreude sentida pelos sportinguistas na véspera transforma-se em monco caído, mas para os mais desportistas a existência de um golo injustamente validado contra os visitantes também tinha caído muito mal. Esses aceitaram a derrota com outra atitude, aquela que diz que o fair-play é uma coisa linda mas tem um pequeno senão: é preciso perder para o mostrar. Tiveram ocasião para o fazer.
Além disso, todos puderam ver uma, duas, três, quatro vezes o treinador da equipa do Sporting atrapalhado, com um tique que possivelmente lhe vem de miúdo: colocar o dedo entre os lábios e o nariz, quase como se fosse a chuchar. Também ele ficou com boas razões para o fazer.

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