3/27/2006

Cabulanço

Logo que escrevi este título, o computador sublinhou-o a vermelho. Constatei que o corrector ortográfico não regista o termo, mas possui outros dois da família: "cabulando" e "cabulado". Já não é mau, admito. E isto porque, segundo aquilo que tenho ouvido por aí e o que acabo de ler num artigo estrangeiro, o cabulanço nas escolas é mais do que muito. Nas minhas últimas experiências pessoais, numa vigilância à disciplina que eu coordenava encontrei 23 alunos com cábulas num exame de frequência que abrangeu cerca de 330 examinandos. Num outro caso, que se tornou mais difícil, tive uma aluna a utilizar o seu telemóvel para receber, de uma conhecedora amiga que estava no exterior, uma tradução perfeita e mais umas quantas frases quase sem erros. Estes casos, quando detectados, acabam por se resolver. Por exemplo, a aluna que utilizou o SMS passou... no ano seguinte.
O assunto está longe de ser só português, como seria de esperar. Nesta febre de competitividade que grassa no mundo estudantil em que por uma décima se entra ou não no curso desejado, produzem-se falcatruas de toda a ordem. Desde ter acesso antecipado a testes a troco de dinheiro até arranjar um substituto com mais conhecimentos que faça o exame, passando pelo plágio de textos da Internet e pela utilização de telemóveis da última geração, MP3 e outra parafernália, os examinandos podem agora até dar-se ao luxo de fotografar um exame de ponta a ponta e enviá-lo para o exterior, aguardando depois a ajuda salvadora.
As instituições têm reagido de duas maneiras. Por um lado, à boa maneira militar usam contra-mísseis para se oporem aos mísseis. Aplicações informáticas como TurnItIn.com e MyDropBox.com comparam já os testes dos alunos com tudo o que esteja disponível na Internet e marcam a vermelho vivo tudo o que tenha sido copiado. Há escolas que introduziram detectores de metais para os examinandos que precisam de ir aos sanitários. Tem, além disso, havido uma redução do número de pessoas com acesso às provas. Nalgumas faculdades de medicina, os candidatos terão a partir do próximo ano lectivo que fornecer impressões digitais electrónicas e submeter-se depois a fotografia digital, a fim de tornar mais fácil a detecção de substitutos em provas de exame.
Por outro lado, há instituições onde foi decidido permitir todo o tipo de consulta. Os examinandos podem, com os seus PDAs e laptops, ter acesso à Internet, à semelhança do que acontece na vida real.
Todos estão de acordo que a concorrência desenfreada que se regista tem contribuído para o aumento do copianço. Mas, indo mais fundo, não se pode ignorar o efeito causado por comportamentos pouco éticos de empresas reputadas mundialmente, como a Enron e a WorldCom, além daqueles cientistas que publicam informação falseada das suas investigações. Sintomaticamente, à pergunta "Concorda ou discorda de que é preciso cabular ou mentir para alcançar sucesso?", incluída num inquérito recente feito a 25 mil alunos do ensino superior da Califórnia, cerca de 50 por cento concordaram abertamente.
E você, alguma vez cabulou?

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