3/11/2005

Pena de suspensão... suspensa

A Lei nº 30/2002 de 20.12 terá suscitado dúvidas a alguns docentes no que se refere à aplicação da medida disciplinar de suspensão. Tais dúvidas foram entretanto «esclarecidas» através da interpretação divulgada pelo Ofício-Circular nº 8 de 14.1.2005, da D.R.E.L., interpretação essa que fere de morte o espírito da referida medida, tornando-a contraditória com o seu objectivo nuclear - punir.
Com efeito, é inaceitável que a aplicação de uma medida disciplinar punitiva possa ser lida pelos discentes como um prémio, isto é, como incentivo à reiteração do comportamento reprovável que deu azo a procedimento disciplinar. Ora é precisamente isso que o prescrito no ponto 1 do mencionado Ofício-Circular objectivamente favorece quando considera justificadas as faltas dadas durante a vigência de uma eventual pena de suspensão, «não contando, portanto, para a expulsão da escola por efeito da ultrapassagem do limite das faltas injustificadas».
Será eventualmente controverso, no âmbito do ensino básico, o duplo efeito punitivo que a dita medida disciplinar na prática pode ter ao provocar nalguns casos exclusão da escola por excesso de faltas injustificadas. Já em relação ao ensino secundário, parece perfeitamente legítimo alargar o espectro da responsabilidade do aluno - é expectável que este tenha a percepção, e por ela responda integralmente, do completo alcance dos seus comportamentos e atitudes, com repercussão não apenas no seu percurso individual, mas também no colectivo/turma em que está inserido e na qualidade do processo de ensino-aprendizagem. Aliás, só mesmo uma enorme ingenuidade ousará imaginar que a pena de suspensão possa surtir, em si mesma, efeitos punitivos... Sem a temida consequência traduzida na impossibilidade de justificar as correspondentes faltas dadas, o infractor tende, isso sim, a assimilar a dita pena a uma agradável pausa lectiva. Em resumo: a medida disciplinar de suspensão é uma pena, e não um prémio, justamente e sobretudo porque as faltas dadas na sua vigência são injustificadas, desenhando um potencial cenário de exclusão da escola. Rasurada esta consequência, a medida de suspensão perderá por completo a sua eficácia disciplinar, ficando votada à condição de letra morta.
Se querem ser respeitados, devem os professores dar-se ao respeito - denunciando as arbitrariedades e inconsistências que minam as orientações administrativas cegas, mesmo que da tutela; recusando-se a aplicar passivamente medidas que deprimam a sua autoridade e autonomia e alimentem o sentimento de impunidade de alguns alunos. Neste caso concreto, é urgente que a D.R.E.L. revogue a orientação acima citada, repondo a legalidade, ou seja, devolvendo à medida disciplinar em causa o espírito que pedagogicamente a justifica: ser efectivamente punitiva.
Todavia, a manter-se em vigor esta orientação, mais valerá então imprimir um mínimo de coerência à incoerência, dela extraindo todas as consequências administrativas, a saber: considerar, já agora, igualmente justificadas as restantes faltas com moldura disciplinar, designadamente as marcadas por efeito da expulsão da sala de aula (nada as distingue, formalmente, das que são marcadas durante a pena de suspensão). Será «a cereja em cima do bolo» - os prevaricadores ficarão decerto gratos à D.R.E.L..

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