Discute-se frequentemente na sociedade portuguesa a questão dos erros cometidos na escrita do português por pessoas com estudos. Admitindo-se embora que a perfeição cabe apenas a Deus e que ninguém é dono da língua, existem mesmo assim umas tantas regras convencionadas para a escrita que contribuem para melhorar a comunicação. Ocorre-me agora a frase "Queremos licenciatura univercitária!", que um bem intencionado aluno de um instituto politécnico proclamava nos anos 80 nos lavatórios da sua escola. Terá decerto incentivado vários dos seus colegas a lutar pelo mesmo desígnio.
A recente decisão ministerial de não considerar parte dos erros ortográficos nas provas de Português dos 4º e 6º anos enfileira naquilo que tem havido: facilitismo grave, que depois conduz a casos de bradar aos céus. Também nas provas de outras disciplinas foi considerado que os eventuais erros de português não contariam para a nota final. Assim, um aluno que responda bem a uma questão, em bom português, não terá melhor nota do que outro que também responda de maneira acertada mas com um "à" em vez de "há", um "á" no lugar de "à", "se quizésse-mos" onde deveria estar "se quiséssemos", "para que a reunião se realiza-se" em vez de "... realizasse", etc. Pragmáticas, houve pessoas que sugeriram que os testes fossem de resposta múltipla, com a marcação da resposta correcta através de um símbolo convencionado.
Lançar a culpa toda do actual desatino linguístico para cima da parafernália de multimédia que nos rodeia é desculpa de mau pagador. Embora seja um factor importante, ignora o preocupante facto de que, por exemplo, alguns docentes também sofrem de problemas desse tipo.
Educar, como tem sido dito vezes sem conto, não é manter as crianças e os adolescentes numa semi-ignorância. É prepará-los para a vida. Não se pode, por um lado, afirmar que os estudantes têm que estar aptos a enfrentar a competição, e depois não tentar afincadamente apetrechá-los com os meios adequados para fazerem face à concorrência que de facto irão sentir.
"Agora os computadores corrigem os erros!" é outro argumento largamente usado. Diz-se isto um pouco como se afirma que "não é preciso saber fazer mentalmente operações aritméticas porque hoje em dia existem os calculadores". A verdade é que, embora essa faceta correctora dos computadores seja muito útil, as máquinas não vão distinguir, por exemplo, entre "consertar" e "concertar", ou entre "coser" e "cozer", porque todas estas formas existem, embora com significados diferentes.
Pessoalmente, não posso deixar de considerar grave a atitude de complacência do Ministério da Educação. A não ser que as ministeriais cabeças achem que a tirada do Eça sobre o dever de se falar "patrioticamente mal línguas estrangeiras" se aplica, afinal, também à própria língua portuguesa na sua forma escrita!
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