11/03/2007

Brasil ou Brazil?

Ontem lembrei-me do Eusébio de há quarenta anos. Quando ele atingiu o auge da sua fama, por alturas do Campeonato do Mundo que se disputou em Inglaterra, os ingleses ensinaram a todo o globo como se pronunciava o nome daquela estrela do futebol: You-say-be-oh. E lembrei-me dele e desta atamancada transcrição fonética do seu nome quando por mim passou um rapaz brasileiro com uma T-shirt canarinha que ostentava, em grandes letras, a palavra BRAZIL. Disse para mim próprio que aquela era, possivelmente, mais uma T-shirt made in China por uma multinacional que grafara o nome em inglês para assim conseguir mais vendas. A pergunta surgiu-me como normal: por que razão escrevem os ingleses o nome dessa antiga colónia portuguesa com um -z- quando os portugueses o escrevem com um -s-?
A resposta, não difícil, é porventura linguisticamente interessante. No século XVII, por alturas de 1640, a velha aliança entre Portugal e a Inglaterra foi reforçada com novas cláusulas que, como se sabe, incluíram a ajuda militar para que Portugal pudesse manter a sua independência relativamente a Espanha, o casamento da princesa Catarina com Carlos II de Inglaterra e um dote que era um senhor dote. Entre outros pontos, aos navios de Sua Majestade britânica era garantido o livre acesso ao Brasil para trocas comerciais. Como é natural, os ingleses não desaproveitaram essa cláusula e fizeram largo comércio com a colónia portuguesa que derivava o seu nome das árvores visíveis ao longo de grande parte da sua costa atlântica. Essas árvores, que refulgiam como fogo (brasa) ao sol, produziam uma bela madeira, que de tanto explorada pode hoje ser encontrada mais em jardins botânicos do que noutros locais. O pau-brasil deu, assim o nome ao país.
Acontece que, na língua portuguesa, o -s- intervocálico lê-se como se fosse -z-. Assim sucede em casa, casino, fuso, luso, atraso, brasa e, naturalmente, Brasil. Ocorre o mesmo em inglês ou não? A resposta, que a minha experiência de professor me diz que muitos portugueses não sabem exactamente, é "umas vezes sim, outras vezes não". Muitas vezes não, de facto. Vejamos alguns dos muitos exemplos em que o -s- entre duas vogais se pronuncia como se fossem dois ss: basic (que muitas pessoas ligadas à informática lêem bázíque), case, casino, crusade, decrease, house, increase, lease, mason (reproduz o maçon francês), mouse, release, research, resources e used (quando significa "dantes" ou "costumava"). Ora bem: se os portugueses liam o -s- como -z, o melhor, pensaram os ingleses, seria grafá-lo como -z- para evitar problemas e impedir que aparecessem pessoas a lerem Brassil (em francês, língua em que o -s- intervocálico se lê como em português, o problema não se colocou, e a escrita é Brésil). Admitamos que foi uma solução pragmática.
Pragmática, mas diferente da solução arranjada para Brasil, foi também a maneira de os ingleses resolverem o problema da grafia de Açores e Moçambique, duas partes do império português com as quais igualmente comerciavam. Como no seu abecedário não possuem o c cedilhado, pespegaram-lhe com um -z-. Foi assim que apareceram Azores e Mozambique.
Ah, é verdade! O tal brasileiro com a T-shirt celebrava a escolha oficial do Brasil como país organizador do Campeonato do Mundo em 2014.

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