4/04/2008

De cavalo para burro

No passado, países como Portugal sempre se sentiram orgulhosos por poder dar lições ao mundo. A que mundo? Bem, ao mundo dos territórios coloniais que lhes pertenciam. Muitos portugueses europeus sentiam-se professores que ensinavam "boas práticas" aos seus alunos, na sua maioria nativos africanos. Quem fez isso durante séculos, sente-se naturalmente superior.
Com a Inglaterra sucedia o mesmo. Correspondência trocada entre ingleses que viveram nas Índias e nas Áfricas denota este facto sem margem para dúvidas. Ora, muitas pessoas da geração que viu os impérios coloniais desmoronarem-se ainda andam por este mundo. A sua cultura é marcadamente diferente da dos jovens de hoje, para quem o império será coisa de livros, de filmes e de histórias contadas pelos mais velhos.
Presentemente, a conversa é outra, porém: a da globalização. Talvez devido a essa globalização, de numerosos países descolonizados entre 1947 e 1975 irrompem agora casos interessantes: são os antigos alunos que vêm adquirir propriedades na terra dos seus ex-professores.
O orgulho ferido dos antigos colonizadores foi amenizado nos primeiros tempos pós-descolonização através da criação ou re-criação de anedotas que ridicularizavam os novos chefes de Estado ou o próprio povo. Os ingleses parodiaram a língua inglesa falada pelos seus ex-súbditos indianos agora independentes, puseram a ridículo através de frases colocadas na boca de chefes africanos a estupidez personificada desses chefes. Esta é sempre a expressão da dor-de-cotovelo que se sente por se ter já perdido o poder de outrora. O mesmo fizeram os portugueses com Samora Machel e com o povo das ruas. Actualmente o número dessas histórias é já muito mais reduzido, tanto na Inglaterra como em Portugal.
A música agora é diferente! Aos poucos, chega algo como o reverso da medalha. Os indianos do grupo Tata compraram há oito anos a mais famosa marca de chás do mundo, inglesa - a Tetley - e recentemente a Jaguar e a Land Rover. O espírito branco colonialista dos tempos de Tarzan, o branco que dominava toda a selva e tinha animais amigos por todo o lado, imagina logo mãos mais escuras a montarem carros-de-luva-branca como o Jaguar. É certo que a Jaguar e a Land Rover até já pertenciam à Ford, da também antiga colónia britânica hoje denominada Estados Unidos da América. Bem, mas aí eram brancos e poderosos. Agora, indianos! (Pois sim, mas não são os milhões de indianos pobres que adquiriram estas marcas. O grupo Tata, expoente dos antigos marajás e símbolo das diferenças abissais que existem na Índia entre ricos e pobres, exibe uma facturação que corresponde a 3,2 por cento do Produto Interno Bruto da Índia!)
Os portugueses, por seu lado, também não vêem com bons olhos os angolanos entrarem na GALP e no Millennium. Mas se não os deixarem entrar cá, verão as portas fechadas em Angola para os grandes negócios. Logo…
Se o cenário de antigas colónias a dominar ou mesmo a adquirir totalmente empresas da antiga mãe-pátria já custa, imagine-se a relutância que interiormente muitos nacionais de países como Portugal sentem quando é a ortografia de uma antiga-colónia - o Brasil - que se pretende venha a influenciar maioritariamente alterações ortográficas de fundo na língua portuguesa! Todas estas coisas estão relacionadas, quer queiramos, quer não!

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