Acabo de ler um pequeno grande livro de José Saramago chamado “As Pequenas Memórias”, que (estranhamente, porque sou há muito fã de Saramago) não me recordo de ter sido lançado. Foi-o em 2006.
Trata-se, efectivamente, de um repositório das memórias de infância e de adolescência de um menino pobre, dividido entre a vida dura na capital e as férias passadas na ribatejana Azinhaga da sua infância.
Poderia parecer, à partida, uma exposição fastidiosa de factos e historietas que mais interesse teriam para memória futura da família, sem grande interesse para o público em geral; não é essa a minha modesta opinião.
Desde logo porque José Saramago está a escrever melhor do que nunca!
A cadência que dá à sua escrita é feita à medida do respirar do leitor: o seu ritmo não seria mais “anatómico” se tivesse a tal pontuação que o acusam de não usar!
É gratificante verificar que aos 86 anos tem um sentido de humor e um sarcasmo que não são cáusticos, antes adoçados pela sua mundividência.
É um prazer ver como ele encadeia ideias de forma tão intrincada, sem jamais se perder nelas nem nos fazer perder a nós, leitores.
Igualmente um prazer apreciar a sua linguagem, o seu vocabulário, misto de vernaculidade e de sabedoria popular, usando os termos regionais do seu Ribatejo natal com a mesma oportunidade com que aplica o léxico mais erudito.
Notável como, do alto da sabedoria da sua velhice, analisa o que sentiu, sofreu, gozou o menino que ele próprio foi e como se confronta com o que sentiu e pensou o então menino.
As passagens da sua vida que o autor revela terem sido inspiradoras das personagens que mais tarde fez habitar nalguns dos seus livros, são meras curiosidades a que os seus leitores fiéis, como eu, por certo acharão alguma graça.
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