5/27/2009

O sapato de Montaigne


Aquando de uma recente estadia em Paris, calhei a ficar num pequeno hotel da rue des Écoles, perto do Boulevard St. Michel. Na rue des Écoles fica também o edifício principal da Sorbonne.É em frente deste edifício que se encontra a estátua de Montaigne (1533-1592) que a foto mostra. Montaigne, que foi aluno do português André de Gouveia, então director do Collège de Guyenne em Bordéus, foi um notável ensaísta. Os seus três volumes de ensaios continuam hoje a ser lidos e estudados, até porque são modernos em muitos aspectos. Neles, o autor revela a enorme virtude de não ser doutoral ao dirigir-se ao leitor, perguntando mais do que respondendo e levantando dúvidas pertinentes. O seu lema é o famoso “Que sais-je?”, o qual deu aliás origem a uma bem conhecida colecção de livros francesa.
"É mais importante encher a panela ou atear o lume?", pergunta Montaigne numa das suas muitas questões no domínio da educação. Por uma vez, neste caso avança com uma resposta, aliás perfeitamente de acordo com o pensar dos nossos dias: "A criança não é um recipiente que devemos encher, mas sim um fogo que é preciso atear."
Os seus ensaios, escritos na remansa quietude do seu château de Montaigne nos arredores de Bordéus, cedo lhe grangearam celebridade no mundo académico. Foi portanto acertadamente que o município de Paris colocou a estátua de Montaigne em frente à Universidade. Note-se, entretanto, que o sapato do pé direito – entrar primeiro com esse pé é importante, lá como cá - está muito mais brilhante do que o outro. Os estudantes acreditam que lhes dá sorte passar ali com a mão e o resultado está à vista. É uma superstição que não traz nenhum mal ao mundo. Quem julgar que se trata de graxa ao mestre está redondamente enganado. Ele não encaixaria coisas desse género.

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