5/12/2010

De volta ao euro


O título da foto que encima este texto parece peremptório: o fim do euro. Vindo de uma revista americana na sua versão internacional, revela muito de wishful thinking: o dólar nunca apreciou a criação do euro e combateu-a fortemente. Todos sabemos que é melhor ter um monopólio do que ver-se obrigado a partilhá-lo; para mais, nos poucos anos passados desde a sua criação, o euro até se valorizou bastante relativamente ao dólar e, o que é bem mais importante, roubou-lhe alguns mercados e a colocação de reservas monetárias de outros países.
Mas será que se trata apenas de wishful thinking americano ou estamos realmente perante um enorme problema que pode eventualmente conduzir ao fim do euro? Esta é já uma outra maneira de encarar a questão, menos peremptória e certamente mais razoável. Ninguém poderá questionar a existência de um mau bocado que a moeda que é comum a 16 países europeus está a atravessar. Como é que chegámos aqui?
Em 1997, portanto já há treze anos, um avisado jornalista (Josef Joffe) do diário alemão Die Zeit empregava uma metáfora interessante. Segundo ele, uma moeda comum sem um governo comum é como várias locomotivas de um mesmo comboio, cada uma delas deslocando-se com a sua energia própria e todas elas atreladas para formarem um comboio único. Cada uma das locomotivas tem de deslocar-se à mesma velocidade, na mesma direcção e ao mesmo tempo. Se os maquinistas não se portarem como se fossem um só, os elos que ligam entre si as carruagens quebrar-se-ão, ou então o comboio saltará fora dos carris.
A crença na possibilidade de todas as carruagens se moverem juntas terá sido a grande falha do projecto. Ao mergulhar no euro, a Europa terá posto o carro à frente dos bois. Para os pessimistas terá sido um milagre que só ao fim de uma década - e na sequência de uma crise global - as coisas se tenham tornado menos cor-de-rosa e mesmo em risco de descarrilar. Isto porque nem todos os maquinistas (governos) tinham a mesma cultura nem os mesmos interesses. Mas todos gozavam de benefícios idênticos quando se tratava de terem juros baixos, por exemplo. Agora, com os problemas gravíssimos da Grécia e de outros países menos controlados nas suas contas, como Portugal e Espanha, além da Itália e da Irlanda, de repente são as diferentes culturas e os diferentes interesses que vêm ao de cima.
Curiosamente, as substantivas discrepâncias que existem entre o rigor de um alemão e a atitude algo non-chalante de um português na maneira de olhar o mundo e a vida ressaltam agora mais do que nunca. Holandeses e belgas, franceses e luxemburgueses não possuem a mesma cultura. Entre os próprios belgas, os francófonos são bem diferentes dos flamengos. É extraordinário como este aspecto das culturas se torna tão influente na condução da economia e das finanças.
A eventualidade do efeito dominó, isto é, de contágio entre os diferentes parceiros que dormem na cama comum do euro, não está de modo nenhum afastada. Por isso, países como Portugal e a Espanha vêem-se forçados a tomar desde já medidas difíceis e certamente pouco populares, com consequências a nível político. É natural, entretanto, que aquilo que está presentemente a suceder sirva de forte chamada de atenção à realidade por parte dos líderes da União Europeia. Por muito que custe aos respectivos países e aos seus desejos de soberania – esta última, aliás, já muito delapidada - , é essencial que exista um controle muito mais apertado, efectuado pela União Europeia, do andamento dos diferentes comboios e respectivos maquinistas.
Entretanto, mantenhamo-nos realistas, mas optimistas!

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