7/12/2006

O Apito Entupido

É uma enorme ironia que, na mesma altura em que a Itália se sagra campeã do mundo de futebol, pelo menos oito dos jogadores da sua selecção - só os da Juventus - estejam em risco de baixar para a segunda ou terceira divisão e de perder os dois últimos títulos conquistados, por conduta incorrecta da administração do clube. A Juventus não está sozinha, embora a maior parte das culpas - concretamente a influência na escolha dos árbitros da 1ª divisão italiana e a formação de uma rede de relações promíscuas com árbitros e funcionários da federação - recaia principalmente sobre ela. O AC Milan, a Fiorentina e a Lazio podem também descer de divisão. A Juventus, inicialmente o clube da FIAT de Turim, conta com cerca de 10 milhões de adeptos e simpatizantes, o que é um número equiparável ao de toda a população portuguesa. Este escândalo, com ramificações nas apostas desportivas, é o maior de que há memória em Itália. Entretanto, registe-se que as investigações demoraram menos de três meses. A gravação das chamadas telefónicas mantidas pelos corruptores foi essencial para a desmontagem do plano.
Pois é. Por cá tivemos algo muito semelhante. Não sei já há quanto tempo, li nos jornais a reprodução de conversas telefónicas arrepiantes entre dirigentes nacionais e árbitros de futebol. Por mais evidente que salte aos olhos o ilícito da situação, o processo não anda. Ou anda e desanda. Demora imenso a sair-se da fase de instrução (fase que não existe em Itália). Volta e meia temos os dirigentes a afirmar que foi tudo uma cabala contra eles. A certa altura as eventuais responsabilidades prescrevem e continua tudo na mesma. E como maçã podre contagia as outras maçãs do cesto, a situação não melhora.
Infelizmente, o futebol é apenas um exemplo do resto. Há quem clame contra a corrupção, mas pouco se faz para a combater verdadeiramente. O mal que a corrupção faz a um país, apesar de dificilmente quantificável, é enorme. Desmotiva as pessoas. Cria um clima de medo entre os que não alinham. Constitui um elogio ao não-trabalho honesto e sério. Enquanto continuarmos a ter apitos entupidos, não se ouvirá o som do apito final para acabar este jogo.

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