Sete e meia de uma manhã de sonho. A praia está ainda deserta de veraneantes. Estamos nos dias finais de Agosto. Não corre qualquer brisa. A maré apresenta-se totalmente vazia, ofertando um vasto pedaço de areal que só as gaivotas aproveitam. Elas são as herdeiras e desfrutadoras naturais de toda esta quietude. Enquanto não chegam alguns madrugadores para o seu exercício físico de caminhar na areia húmida, as gaivotas podem estar descansadas. No bando, que diviso perfeitamente da minha varanda, não noto a existência de qualquer João Capelo rebelde que abandone o grupo e voe para outras paragens. Esse rebelde estaria possivelmente condenado ao sofrimento, rejeitado que seria por outros bandos. É unidas que as gaivotas vivem melhor. Ao entardecer, sensivelmente à hora a que o sol se põe, voarão para o seu local de descanso nocturno. Voarão igualmente em bando, todas na mesma direcção, mas dividir-se-ão em pequenos grupos de três ou quatro, com segundos de intervalo umas das outras. Lá longe, juntar-se-ão algures, junto a rochedos mais abrigados.
Por ora, estão a gozar os raios deste sol que ainda não aquece verdadeiramente e lhes permite serem as rainhas e os reis do areal.
Cá em cima na arriba começam a fazer-se ouvir os almeidas da Câmara. Vêm fazer a recolha de algum lixo que não foi colocado em contentores. Passam os primeiros carros a acelerar. Contrastam fortemente com a serenidade patenteada pelas gaivotas lá em baixo, junto ao mar. As aves revelam um elevado sentido de timing e bom senso no aproveitamento do que a natureza lhes oferece. O mar está calmíssimo, fera amansada que atira, na sua orla final, uma ligeira fímbria de espuma sobre o areal. Alguém terá andado durante a noite a passá-lo a ferro, como aqui se diz.
Por baixo da minha janela passa o primeiro transeunte. Contempla o mar à medida que anda. Traz na mão direita um saco de plástico com o pão ainda quente que a padaria acabou de lhe vender.
A senhora que o ano passado passeava aqui o seu bebé no carrinho, mesmo à beira de água, e que eu acabei por colocar no blog como foto de postal de férias, já estará hoje provavelmente a dar-lhe uma papa lá em casa.
São já oito e trinta. Esta praia imensa continua desaproveitada pelos homens. Está um dia de eleição, talvez o melhor do mês. Entretanto, diviso para norte, junto a uns rochedos que agora são acessíveis, pescadores a tentar apanhar polvos. O bando de gaivotas mantém-se bem no centro da praia, naquele que é geralmente o local de banhos. Começa, no entanto, a denotar alguma inquietação. Uma ou outra gaivota ensaia um voo, volteja por breves instantes e volta a poisar no seu local.
Passam mais pessoas por baixo da minha janela. Homens de idade. São geralmente os idosos os que se levantam mais cedo. Estão mais próximos da natureza, eles que se sentem condicionados pelo frio, o sol e a humidade excessiva. Com a idade voltamos todos a uma ligação mais íntima com a natureza, algo que tínhamos perdido na primeira infância. Deitar com as galinhas, levantar com os galos passa a ser o lema.
Aqui por baixo surgem dois cães. Farejam coelhos eventualmente escondidos nas arribas, junto aos chorões. Nada encontram. Acabam por fazer apenas as suas necessidades, os dois simultaneamente. Não ladram nem fazem qualquer barulho. Também não serão eles a quebrar a quietude do início da manhã.
Por ora, estão a gozar os raios deste sol que ainda não aquece verdadeiramente e lhes permite serem as rainhas e os reis do areal.
Cá em cima na arriba começam a fazer-se ouvir os almeidas da Câmara. Vêm fazer a recolha de algum lixo que não foi colocado em contentores. Passam os primeiros carros a acelerar. Contrastam fortemente com a serenidade patenteada pelas gaivotas lá em baixo, junto ao mar. As aves revelam um elevado sentido de timing e bom senso no aproveitamento do que a natureza lhes oferece. O mar está calmíssimo, fera amansada que atira, na sua orla final, uma ligeira fímbria de espuma sobre o areal. Alguém terá andado durante a noite a passá-lo a ferro, como aqui se diz.
Por baixo da minha janela passa o primeiro transeunte. Contempla o mar à medida que anda. Traz na mão direita um saco de plástico com o pão ainda quente que a padaria acabou de lhe vender.
A senhora que o ano passado passeava aqui o seu bebé no carrinho, mesmo à beira de água, e que eu acabei por colocar no blog como foto de postal de férias, já estará hoje provavelmente a dar-lhe uma papa lá em casa.
São já oito e trinta. Esta praia imensa continua desaproveitada pelos homens. Está um dia de eleição, talvez o melhor do mês. Entretanto, diviso para norte, junto a uns rochedos que agora são acessíveis, pescadores a tentar apanhar polvos. O bando de gaivotas mantém-se bem no centro da praia, naquele que é geralmente o local de banhos. Começa, no entanto, a denotar alguma inquietação. Uma ou outra gaivota ensaia um voo, volteja por breves instantes e volta a poisar no seu local.
Passam mais pessoas por baixo da minha janela. Homens de idade. São geralmente os idosos os que se levantam mais cedo. Estão mais próximos da natureza, eles que se sentem condicionados pelo frio, o sol e a humidade excessiva. Com a idade voltamos todos a uma ligação mais íntima com a natureza, algo que tínhamos perdido na primeira infância. Deitar com as galinhas, levantar com os galos passa a ser o lema.
Aqui por baixo surgem dois cães. Farejam coelhos eventualmente escondidos nas arribas, junto aos chorões. Nada encontram. Acabam por fazer apenas as suas necessidades, os dois simultaneamente. Não ladram nem fazem qualquer barulho. Também não serão eles a quebrar a quietude do início da manhã.
Pronto! Surgiu a primeira banhista. Uma senhora mais ou menos adiposa, de fato de banho preto, procura perder peso através do seu passeio matinal. Dirige-se para a beira de água. Certamente não para afugentar as gaivotas, apenas para sentir na planta dos pés o fresco da água do mar. As aves começam a agitar as asas. Duas delas lançam-se para o ar, no que são seguidas a espaços pelas restantes. Certas de que dali não lhes vem perigo, dão uma volta e poisam de novo, um pouco mais longe. Surgem, porém, mais pessoas. A situação torna-se insustentável. O bando levanta voo, desta vez mais alto, e desaparece nos ares, direcção ao sul.
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