9/06/2007

Feitios

Num livrito que uma vez publiquei juntamente com um colega, deixei registado um breve apontamento relativo a uma sensação que experimentei frequentemente como professor. Essa sensação era a de que não podia deixar de considerar estranho que alunas minhas do curso de Secretariado, que faziam ditados nalgumas aulas, vissem apontado não o número de palavras certas, mas sim o número de erros que tinham cometido. Entenderia melhor a situação se uma aluna fizesse 20 ou 30 erros, mas no que toca àquelas estudantes que faziam um ou dois erros num texto de 200 palavras, parecia-me um exagero. Era assim a prática, no entanto. Discuti-a com as alunas que, no entanto, a consideraram tão normal que não viam nenhum mal nisso. Achei-me mais papista que o papa, mas mesmo assim considero que num ditado de 200 palavras seria mais correcto escrever 199/200, do que 1 a vermelho, no canto superior direito.
Isto vem a propósito do jeito que um número muito significativo de pessoas tem de não olhar para o lado positivo que outros já fizeram. Consideram-no normal e "já feito". O trabalho delas é que conta, misturado com uns ais de sofrimento e uma ladainha de esforçados labores narrados depois a amigos. O que os outros fizeram não foi mais do que a sua obrigação.
Essas são também as pessoas que tendem a falar muito de si próprias quando estão com outras. Raramente discutem ideias objectivamente, per se. É geralmente a sua posição face a determinadas coisas, num estilo de "adoro" ou "detesto". Tudo acaba por ser, afinal, uma outra maneira de falarem de si próprias. Se têm histórias interessantes para contar, ainda vale. Se não, é melhor desligarmos.
Valorizar os lados positivos dos outros é importante. Assim como ouvir mais do que falar, na linha daquele velho ditado grego que nos diz que Deus nos deu duas orelhas e só uma boca para que falemos apenas metade do que ouvimos.

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