3/27/2008

Europa em revolta contra o hipercapitalismo

O penúltimo número da revista Newsweek inclui um artigo interessante, que não vi transcrito ou resumido nos media portugueses. Tudo começou há dois anos, quando os serviços secretos alemães conseguiram subornar um funcionário de uma importante instituição bancária do Liechstenstein. Ofereceram-lhe uma quantia considerável (4,2 milhões de euros) e um novo nome e passaporte em troca de um CD cujo conteúdo consistia nos nomes, contas e correspondência financeira de 1400 abastados clientes estrangeiros. Há três semanas, investigadores alemães efectuaram 120 visitas-busca baseadas na informação recolhida, tendo obtido confissões que prefiguram um total de 29 milhões de euros em impostos recuperados - estando estes números em crescendo a cada dia que passa. As pessoas que foram alvo das buscas incluem figuras bem conhecidas, como o Administrador-Geral dos Correios, Klaus Zumwinkel.
Por seu lado, as autoridades do fisco da Finlândia e da Noruega encontram-se presentemente a dar caça aos nacionais dos seus respectivos países cujos nomes constam igualmente do CD. Mais de uma dúzia de outros estados, v.g. França, Grã-Bretanha e EUA, iniciaram as suas próprias investigações.
A celeuma e as manifestações que este caso já provocou não são coisa de pouca monta, a julgar pelos meios de comunicação social. A revista Stern titulava a sua capa da semana passada "Elites sem moral - como os ricos estão a minar a nossa sociedade". A Manager Magazine inquiria: "Está o supercapitalismo a destruir a democracia?" "Evasor Fiscal Inimigo do Estado", proclamava a revista Spiegel, exibindo a foto de mais um administrador de uma empresa de topo.
É, aliás, na Alemanha, que a luta anti-capitalista está a ganhar mais força. "Este problema de fuga aos impostos só vem reforçar a ideia que os alemães têm profundamente enraizada de que os ricos só o são por explorarem os pobres", escreve um analista político. As consequências deste facto invadem, como seria previsível, o campo político. No penúltimo domingo, em eleições regionais, Hamburgo tornou-se o terceiro estado alemão em outras tantas semanas a destronar uma governação conservadora e a eleger um partido radical de esquerda, ex-comunista - e Hamburgo é um estado que está em franco desenvolvimento e onde a taxa de criminalidade é baixa.
Em França, é notório o facto de Jérôme Kerviel, o homem que custou quase 5 biliões de euros à instituição financeira Société Générale no passado mês de Janeiro, ser visto por muitos não como um criminoso, mas sim como uma vítima do hipercapitalismo. Em Inglaterra, é pelo menos interessante notar que o recente livro do correspondente de economia da BBC, Robert Peston, Who Runs Britain? How the Super-Rich Are Changing Our Lives está rapidamente a tornar-se um best-seller.
Na medida em que tem como pano de fundo a era da globalização, uma inflação crescente, taxas de desemprego elevadas em determinados países e um sério abrandamento da economia dos Estados Unidos, creio que um assunto desta ordem deve merecer a nossa atenção.

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