5/17/2008

Não é fácil governar um país onde se morre mais do que se nasce

Foi talvez há uns dois anos que coloquei aqui um pequeno texto sobre uma funcionária de um banco que, casada e a aproximar-se dos 30 anos, não via possibilidade de ter filhos devido ao seu horário. O facto de viver do outro lado do Tejo fazia com que se levantasse bastante cedo para estar cerca das oito horas no seu posto de trabalho. Não estava de volta a casa antes das 19:30. Felizmente, a entidade patronal deu-lhe a possibilidade de mudar para uma sucursal da margem esquerda e hoje a P. está mais feliz, com a sua bebé.
Esta introdução vem a propósito das estatísticas demográficas reveladas recentemente pelo INE relativas a 2007. A moça em questão deve ter acertado na média etária com que as mulheres portuguesas têm agora o seu primeiro filho: aos 28 anos. Nada cedo, convenhamos. E têm muitos filhos mais? Que ideia! Mais de 70 por cento das famílias do nosso país são constituídas por pai, mãe e um único filho (ou filha, naturalmente). Cada mulher tem em média 1,36 filhos, o que, como se sabe, está longe de assegurar a renovação geracional.
Porém, mais do que isso, 2007 foi o primeiro desde os registos iniciais existentes a contar com mais mortes do que nascimentos. Em números redondos, morreram 104 mil pessoas e nasceram 102 mil bebés. De um lado, temos um extraordinário aumento da população idosa (mais de 64 anos). Imagine-se que por cada 100 jovens (1-15 anos) há hoje em dia em Portugal 112 idosos! O número dos indivíduos com mais de 65 anos aumentou 30 (!) por cento nos últimos 16 anos.
Do lado dos nascimentos, verificamos que em 1960, portanto há cerca de 50 anos, o total anual ascendia a cerca de 214 mil. Em 2007, os bebés que nasceram ficaram-se pelos 102 mil já referidos, i.e. menos de metade. Dá que pensar! E estas não são coisas que se mudem de um dia para o outro, a não ser que haja novo grande influxo de imigrantes.
Quando há poucos meses estive na Índia, impressionou-me o elevado número de jovens. Soube depois, de fonte oficial, que 70 por cento dos indianos tinham menos de 35 anos. Fantástico!
Aqui pergunta-se: por que razão é Portugal já o oitavo país mais envelhecido do mundo? Para além da óbvia constatação de que há sete outros países que ainda são menos jovens do que nós, ocorre-nos naturalmente perguntar “porquê?” De facto, na década de 60 a média de filhos por mulher que se registava em Portugal era de 3,6. Na Europa, só a Irlanda nos batia! Se desde essa altura até agora o nosso Produto Interno Bruto cresceu substancialmente, é normal que se levante outra questão: terá a satisfação das pessoas acompanhado o crescimento do PIB? Se calhar, não. A Associação Portuguesa de Famílias informa que há cerca de 20 por cento de portuguesas em idade fértil que gostariam de ter três ou mais filhos; vistas as coisas, só cinco por cento os têm. Porquê? Será que o preço das casas, que disparou há uns anos, tem influência nesta situação? Será que o custo de colocar um bebé num jardim-de-infância é aceitável para a maior parte das famílias? E se forem duas ou três crianças? Note-se que, na Europa, nenhum outro país bate Portugal no número de casais em que tanto o marido como a mulher trabalham fora de casa (74 por cento). E a precariedade do emprego ajudará a constituir família?
Em 1960 ainda havia uma poderosa influência da Igreja Católica no nosso país, principalmente no Norte. Hoje em dia, a Região Norte é, paradoxalmente, aquela onde as mulheres têm menos filhos. Muita razão pode ter o Papa para lamentar a diminuição da influência da Igreja em Portugal, mas a verdade é que as pessoas que vivem com problemas concretos já não prestam grande atenção às recomendações eclesiásticas sobre medidas anticoncepcionais.
E os problemas que a situação ocasiona a nível das escolas? A certa altura, num exemplo entre muitos, temos professores a mais para alunos a menos. E que dizer da Segurança Social, com naturalmente menos contribuintes para um cada vez maior número de beneficiários? Esta é, indesmentivelmente, uma bomba-relógio.
Não é fácil a um Governo administrar um país assim. Fácil é, da parte dos cidadãos, exigir um maior número de creches públicas a preços acessíveis, mas de onde virá o dinheiro? Se for retirado dos fundos da Segurança Social ainda mais depressa alargará o buraco. Professores sem alunos, por exemplo, aumentarão a taxa de desemprego. Maiores colectas do fisco causarão um enorme descontentamento e acabarão com o desenvolvimento da economia.
Gostaria de ser mais optimista sobre o assunto, mas os números não me deixam. Sorry! Mesmo assim não sou catastrofista. Estes movimentos são lentos, embora garantidos. Se nada for feito para arrepiar caminho, a situação tenderá a agravar-se. O descontentamento alastrará.

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