10/17/2009

Arejando




Uma breve escapada da cidade pode ser extremamente salutar. Em Lisboa, rotinamo-nos por demais em vistas curtas e conversas só aparentemente longas e profundas. Limitados que estamos por ruas e corredores do Metro, encafuados que vivemos em escritórios, centros comerciais, cafés ou bares, esquecemos frequentemente a outra vida que não é assim. Na tradicional província que todos conhecemos, metade rural, metade urbana, o tempo tende a assumir uma outra dimensão, a correria é mais suave, embora muitas das tarefas não sejam menos duras. Respira-se um outro ar. Ao citadino sabe-lhe bem variar e encontrar um outro mundo em que se fala a mesmíssima língua, se ouvem provérbios que por vezes já tínhamos esquecido e, principalmente se vêem usos e costumes que podem parecer de outros idades do tempo. Contudo, o calendário é o mesmo, o ano, o mês e o dia não são diferentes. Nem diferentes são as pessoas. Mas têm outros pontos de vista. Se o hábito faz o monje, também a terra faz a mente.
Na minha curta saída da cidade por três dias, fui dar um pulinho até à Beira Interior. Por um lado, interessava-me rever coisas que já conhecia, por outro estava curioso relativamente a algumas novidades. Nada foi decepcionante, embora nem tudo tivesse agradado, como é natural. O saldo final foi claramente positivo.
Dias depois da realização das eleições para as autarquias, foi um prazer encontrar tantas melhorias na maior parte das povoações que visitei. Democraticamente, a concorrência entre vilas funciona mesmo e faz com que o nível geral de qualidade do equipamento à disposição das populações esteja muito mais elevado do que num passado não muito distante. Estive em Miranda do Corvo, na Lousã, em Góis, Arganil, Côja, Mangualde, Penalva do Castelo e Viseu. Curiosamente, encontrei muitos pontos comuns. Digamos que toda a povoação que se preze possui, para condicionamento do trânsito, um número maior ou menor de rotundas mas, certamente mais interessante do que isso, é a constatação de que praticamente todas as vilas possuem zonas pedonais, o que, para além de representar um enorme alívio para quem está saturado do mundo dos escapes dos automóveis, permite compras descontraídas ou um almoço ao ar livre numa esplanada quando o tempo está bom, como foi o caso. Para além de possuírem edifícios modernos ou restaurados na Câmara Municipal e no Domus Justitiae, frequentemente alindados com fontes ou repuxos nas proximidades, quase todas estas povoações dispõem de uma biblioteca municipal, museus com características diversas, amplas áreas reservadas para escolas básicas e secundárias – geralmente equipadas com bons campos de jogos e ginásios -, um posto de informação turística que funciona, jardins floridos, higiene nas ruas e, ainda, Centros de Dia, Lares para Idosos e parques infantis. Nalguns casos encontrei teatros restaurados. Algumas das povoações possuem curiosos painéis de azulejos com a heráldica respectiva e os pontos de maior interesse na terra e zonas circundantes. Fontes e lavadouros públicos restaurados também são frequentes. Em terras que são de montanhas e ficam a alguma distância do mar, algo que me chamou a atenção foi a existência de praias fluviais, geralmente com acolhedores jardins relvados à beira-rio. (Tenho pena de não poder incluir aqui alguns dos muitos slides que fiz, mas terei muito gosto em enviá-los a quem lhes queira dar uma mirada.)
Como seria previsível, nesta altura encontrei múltiplos cartazes dos diversos partidos políticos, predominantemente dos principais (PSD e PS). Atendendo aos bons resultados que os partidos-ampulheta CDS e BE alcançaram nas legislativas, talvez se esperasse proeza semelhante nas autárquicas. Existe, no entanto, uma enorme diferença não só entre a estrutura tanto do PSD como do PS, mais o PCP, e os outros dois acima referidos. Estes, CDS e BE, farão uma decente oposição palavrosa no Parlamento, mas quanto a obras verdadeiras, à criação do bem-estar acima descrito, os eleitores parecem preferir claramente os fazedores aos faladores: res non verba. A obra conta.
Por último, gostaria obviamente de recomendar a zona para quem eventualmente a não conheça ainda. As aldeias de xisto da Lousã e de Góis, a excepcional aldeia do Piódão (tomar a estrada Vide-Piodão, 11 quilómetros apenas, em vez da mais moderna que não é recomendável a quem sofra de vertigens), em Penalva do Castelo a Casa da Ínsua recentemente inaugurada como hotel de charme com os seus belos jardins e solar, o Santuário de Nossa Senhora das Preces a uns quilómetros da Ponte das Três Entradas, a casa tristemente em ruínas da família de Aristides de Sousa Mendes em Cabanas de Viriato, a igreja moçárabe de Lourosa e outros pontos de interesse são recomendáveis, sempre em locais muitos florestados, com rios e arroios a ziguezaguearem por ali. Quanto à comida, é farta e bem cozinhada. E é sempre bom trazer para casa umas tantas garrafas de vinho do Dão, preferencialmente compradas nas Adegas Cooperativas, onde são mais em conta.

Sem comentários:

Enviar um comentário