10/12/2009

Obama nobelizado


Foi com uma certa surpresa que eu, admirador confesso da inteligência e do estilo de Barack Obama, ouvi o anúncio da distinção do Nobel para a Paz que o comité norueguês lhe atribuiu. Não pude deixar de considerar algo extemporânea esta distinção. Quando esse mesmo prémio foi conferido a Nelson Mandela, certamente que achei absolutamente justo. Toda a vida do dirigente da África do Sul e o modo sereno mas firme como saiu do seu longo cativeiro em prisões estatais constituíam um hino à paz. Quando os líderes de Timor-Leste receberam idêntica distinção, houve uma "lição política para o mundo", tal como no caso de Mandela, mas existia muita obra feita, e também muita por fazer. O prémio constituiu um reconhecimento pelo passado e um incentivo para o futuro.
No caso de Obama é diferente. É certo que ele restituiu a América ao mundo, quebrando muito do anti-americanismo que se sentia em todo o lado, mas está muito longe de ter resolvido problemas graves na própria América e de ter encontrado soluções efectivas noutros locais do globo em que os americanos se atolaram ao longo dos anos. É natural, aliás: tem pouco mais de um ano de governação.
O principal dos problemas situa-se, sem sombra de dúvida, nas intermináveis disputas bélicas entre Israel e os palestinianos, com evidente superioridade militar da parte de Israel, país que tem repetidas vezes desrespeitado as decisões da ONU. Ainda recentemente Obama expressou, brilhantemente como sempre, as suas ideias sobre o conflito. Os israelitas deixariam de construir mais colonatos em terra palestina. Pouco tempo depois, o parlamento de Israel aprovou a construção de mais umas centenas de colonatos. Qual foi a reacção da Administração americana? Silêncio, tanto quanto me recordo. E não se pode dizer que a América se coíbe de intervir num estado soberano; de facto, já o fez tanta vez noutros países! Que se saiba, o governo americano não cortou quaisquer apoios a Israel. Terá sido este um notável contributo para a paz?
Gostei do que Obama fez relativamente às bases anti-mísseis projectadas em dois países do leste europeu. Mas isso dará para Nobel?
Pagar uma obra antes que ela seja feita não é geralmente visto como boa política. A atribuição daquele que é o maior prémio mundial do género não deve ser encarado como mero incentivo para o Presidente dos EUA. Ele tem mostrado à evidência que é uma pessoa extremamente consciente, que defende valores que são partilhados por milhões de pessoas em todo o mundo. Portanto, não é de incentivos que ele precisa. Pergunte-se, entretanto, se Obama mandou retirar as tropas americanas estacionadas no Iraque? Ainda não. Não é um facto que pensa reforçar os efectivos que estão a lutar no Afeganistão? É. E envolver-se mais no Paquistão? Parece que sim. Tudo somado, digamos que encontramos um novíssimo estilo, uma pessoa muito carismática com a qual, se não somos conservadores americanos, simpatizamos a sério, mas faltam concretizações dos seus planos e declarados anseios. Vamos aceitar, justificadamente, que um ano é um tempo curtíssimo para fazer muita obra. Em que medida é que o que já fez será suficiente para a atribuição do Prémio Nobel da Paz? Este pode soar como homenagem ao primeiro presidente não-branco dos Estados Unidos, mas também pode surgir como o oposto do res non verba. Ora, numa instituição que estuda cuidadosamente obras já realizadas, como fez este ano por exemplo no campo da Física e da Medicina, o que Barack Obama concretamente já fez, se descontarmos o importante desanuviamento através do diálogo que tem praticado com algum sucesso, é demasiado pouco para um Nobel. Mas esta é apenas uma opinião.

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